sexta-feira, 7 de agosto de 2009
O SONHO E A OBRA - 1950 - NASCE A FÓRMULA 1
A época desportiva de 1950 começou, na realidade, em fins de 1949 com a primeira corrida da já clássica "Temporada Argentina" onde a Ferrari compareceu em força, obtendo quatro vitórias nas quatro corridas em que participou.
Nas provas para monolugares de "Fórmula Livre" apresentou três 166 FL com compressor tripulados por Alberto Ascari, Luigi Villoresi e Danino Sarafini que se defrontaram com dois monolugares da Equipa Argentina para Juan Manuel Fangio e Benedito Campos, um 1 500 cm3 mono compressor de Peter Whitehead, a aguerrida concorrente Maserati com três carros com motores sobrealimentados de 1 720 cm3 entregues a Nino Farina, Príncipe Bira e Piero Taruffi, assim como três 1 500 cm3 para Froilan Gonzalez, Reginal Parnell e Emanuel de Graffenried e ainda o Maserati-Milão de Felice Bonetto.
Presentes também dois velhos Talbot Lago de 4 500 cm3 sem compressor dos franceses Philippe Etancelin e Louis Rosier.
Alberto Ascari vence, a 18 de Dezembro, o Grande Prémio General Peron e Gigi Villoresi vence o Grande Prémio Evita Peron. Ascari volta a impor-se ao ganhar a corrida de Mar del Plata, uma localidade balnear situada 400 quilómetros a sul de Buenos Aires e Villoresi conquista, por último, o Grande Prémio de Rosário.
Na corrida para carros de sport que fazia parte do programa de Mar del Plata impôs-se o ídolo local Carlos Menditeguy, um piloto amador que, apesar da insuficiência de treinos, obtinha sempre bons resultados quando corria.
O sucesso com os Ferraris continuou no Grande Prémio de Marsiglia, em Fórmula 2, ganhas por Villoresi seguido de Ascari, Fangio e Sommer.
Os carros de sport levam para Maranello bastantes vitórias obtidas em corridas quer em Itália quer no estrangeiro, mas a atenção não se concentrava apenas nesses carros.Em 1950 iniciava-se, na Fórmula 1 e o confronto directo com as rivais italianas Alfa Romeo e Maserati, de longe, as mais fortes de quantas outras da Europa daquele tempo. E, claro, o verdadeiro objectivo da Casa de Maranello era bater estas duas marcas.
AS "MILLE MIGLIA"
Os dois primeiros motores projectados por Lampredi, com a sigla 275 e uma cilindrada total de 3 300 cm3, foram montados em dois carros para disputarem as Mil Milhas, entregues a Ascari e Villoresi, respectivamente com os mecânicos Nicolini e Pascual Cassani, mas não chegaram ao fim devido a problemas de caixa.
Contudo, a vitória chegava à Ferrari através da proeza do jovem Conde Giannino Marzotto que conseguiu um feito histórico numa corrida que ficou conhecida como "la corsa in doppiopetto" por o herdeiro da família de um industrial de têxteis de Veneza ter conduzido toda a prova vestindo um elegante terno azul, feito na sua empresa familiar, apesar da chuva torrencial que caía sobre a sua "berlineta spider".
Marzotto, acompanhado do seu amigo Marco Crosara, conduziu impecavelmente, sempre colado aos dois pilotos oficiais da marca, seguindo em primeiro quando estes desistiram.
Os três irmãos de Marzotto também participaram conduzindo Ferraris: Vittorio Emanuele classificou-se em nono e Umberto e Paolo desistiram devido a acidente.
A surpreendente vitória de Giannino Marzotto num 195 S com motor de 2 341 cm3 foi excelente para a jovem fábrica pois tinha sido obtida por um piloto não profissional, embora muito bom e, desta forma, serviu de publicidade ao novo modelo destinado a clientela não estritamente desportiva.Feitos destes eram extraordinariamente úteis para a Casa de Maranello pois permitia alargar o seu mercado.
FÓRMULA 1
O momento da verdade aproximava-se pois a CSI - Comission Sportive International da FIA havia aceite a proposta do delegado italiano António Brivio-Sforza para ser criado o Campeonato do Mundo de Pilotos de Fórmula 1 a ter início em 1950.
A 10 de Abril, no Grande Prémio de Pau, em França, a Ferrari apresentou três carros, ainda do velho tipo, para Villoresi, Ascari e Raymond Sommer contra três Maseratis, quatro Talbots e três Simca-Gordinis.
Fangio pilotava um Maserati da equipa argentina e ganhou com 30 segundos de vantagem sobre Villoresi.Fangio era já piloto da Alfa Romeo quando, a 16 de Abril, correu com um Alfetta 158 em San Remo, embora sem ser em representação da marca.
Tratou-se de uma manobra astuta pois se as coisas corressem mal podia-se sempre atribuir à pouca adaptação do piloto ao carro, mas se, pelo contrário, o resultado fosse bom o mérito era todo do carro.Mostrando todo o estofo de que era feito, o argentino enfrentou sete Ferraris, entre os quais dois 125 GPC tipo 48 com Ascari e Villoresi e oito Maseratis, acabando por vencer Villoresi por uma escassa diferença.
A mensagem era bem clara: a Alfa estava pronta para enfrentar as outras equipas.
A primeira competição para o campeonato do mundo de pilotos era o Grande Prémio da Grã-Bretanha, a 13 de Maio em Silverstone (naquela altura na Grã-Bretanha corria-se ao sábado).
Enzo Ferrari decidiu não participar e, embora as razões da renúncia não fossem claras, pode-se presumir que agia com sábia avaliação das despesas e das respectivas contrapartidas. A Ferrari era ainda uma pequena empresa artesanal, que tinha de se manter pelos seus próprios meios, em comparação com grandes complexos industriais como a Alfa Romeo e a Maserati.A deslocação a Inglaterra era longa, onerosa e de resultados incertos. Por isso, foi escolhida uma manifestação muito mais aconselhável no ponto de vista de resultados:o Grande Prémio de Mons para fórmula 2, uma prova dividida em duas mangas e uma final. Ascari e Villoresi ganharam tudo seguidos de Sommer.
Finalmente, chegou o primeiro grande encontro directo com a Alfa Romeo no Grande Prémio de Mónaco, no circuito citadino de Monte Carlo, um acontecimento clássico destinado a impor-se até aos dias de hoje.
Os três Ferraris de Ascari, Villoresi e Sommer não chegaram a tempo das sessões de qualificação e alinharam na terceira linha da grelha para disputarem a prova com três Alfas, cinco Maseratis, três Talbots e um ERA.
A prova, disputada pelas não muito largas ruas da cidade, era propícia a que o mínimo problema provocasse grandes riscos que foi o que sucedeu, logo no fim da primeira volta, quando Farina colidiu com Gonzalez originando uma grande confusão de carros.Fangio habilmente e com sorte conseguiu passar e colocar-se na primeira posição que manteve até final. Ascari ficou em segundo e Sommer em quarto, atrás de Chiron, mas era evidente que, sem o acidente, os Alfas teriam conquistado os três primeiros lugares.
Entretanto, em Maranello, Enzo estudava o que fazer e decidiu continuar a enviar para as corridas carros com motores sobrealimentados enquanto, em segredo, continuava o desenvolvimento do motor aspirado.
Na competição seguinte, o Grande Prémio da Suiça, realizada a 4 de Junho, os três Ferraris foram obrigados a desistir. O de Ascari por avaria no motor e os de Villoresi e Sommer por quebra dos semi-eixos pelo que foi insuficiente a satisfação ao saberem que também o Alfa Romeo de Fangio tinha sido forçado a abandonar.
Para o Grande Prémio da Bélgica, realizado duas semanas depois, hesitou-se entre mandar o novo carro ou um seu clone, tendo-se optado por esta última hipótese. Assim, montou-se um motor tipo 275 com carburadores aumentados e cárter seco num chassis tipo GP 49 com uma nova caixa e diferencial.
Ascari conseguiu ficar em quinto atrás dos três Alfas de Fangio, Fagioli e Farina e de um surpreendente Rosier com um velho Talbot. Villoresi com o 125 com compressor não conseguiu mais que um sexto lugar.
Mas a grande novidade era que os carros com compressor consumiam cerca de 9,5 litros por volta, ao longo dos 14 quilómetros do circuito de Spa-Francorchamps, enquanto o 275 gastava apenas 4,8 litros. Isto abria novas perspectivas de estratégia e pressagiava o fim dos motores sobrealimentados.
Com a habitual técnica do aumento progressivo da cilindrada do Tipo 275 fazia-se, ao mesmo tempo, o acompanhamento do Tipo 340 de 4 100 cm3 testado no Grande Prémio de Genebra, competição não pontuável para o campeonato do mundo. A versão final do Tipo 375 de 4 500cm3 estava pronta para a sua estreia no Grande Prémio de Itália, a 3 de Setembro.
Em Monza, na pista da casa, o esquadrão de cinco Alfas eram como o Golias contra o pequeno David - Ferrari que participava com Alberto Ascari e Dorini Serafini.Ascari mantém uma animada luta com Farina até o seu motor morrer. Toma, então, o carro de Dorini e termina em segundo lugar atrás do pequeno Alfetta 158 de Nino Farina que venceu assegurando, assim, o primeiro título mundial de condutores na história da moderna Fórmula 1.
Mas o segundo lugar de Ascari abala o estado de espírito da Alfa pois, a partir daquele momento, a Ferrari passava a ser uma referência da Fórmula 1 tornando-se a grande protagonista no mundo dos grandes prémios.
A PRODUÇÃO
Para além do considerável esforço feito para desenvolver o monolugar de fórmula 1, em 1950 foram concluídos dois modelos com a evolução do motor projectado por Colombo com o respectivo aumento de cilindrada do modelo 195.
Assim, o motor de 2 341 cm3 foi oferecido em duas versões: a S com 170 cavalos destinada a competições e a Inter para modelos de grande turismo.Por sua vez, do motor de Lampredi derivara o modelo Tipo 275 de sport e o 340 América, nome que indicava já claramente a ambição da jovem empresa pelo mercado dos Estados Unidos.
Previsto como modelo de grande turismo, os primeiros exemplares produzidos do 340 foram, no entanto, utilizados em competições e catalogados como sport/protótipos.As siglas dos novos modelos continuaram com o sistema original na qual o número indicava a cilindrada unitária, embora arredondado para mais fácil memorização.
Venderam-se 26 automóveis fornecidos, geralmente, apenas em chassis no qual o cliente mandava montar uma carroçaria a seu gosto.
A Ferrari passara a ser uma marca na moda que tentava os mais famosos estilistas de automóveis de Itália à Alemanha; de Fontana à Touring agli Stabilimenti Giovanni Farina; de Vignale a Campana.Outros se seguiram e de todos emergiu Battista Pininfarina destinado a ser, nos anos seguintes, o principal estilista da Casa de Maranello e a realizar automóveis dotados de grande encanto e beleza.
No anuário de 1950 que, contrariamente aos anteriores e seguintes, tinha apenas oito páginas, quatro das quais com ilustrações do interior da fábrica com as suas máquinas e instrumentos sendo as restantes com a actividade desportiva.
A Ferrari participou, directamente ou através dos seus clientes, em 74 competições. Venceu 46, com 33 segundos e 18 terceiros lugares, para as quais foram preparados 167 carros. Os cuidadosos contabilistas da empresa anotaram e registaram 107 650 quilómetros percorridos.
No seu prefácio, Enzo Ferrari refere-se ao "amigo Sommer" como um dos mais preciosos colaboradores e talentoso piloto que morreu aos 44 anos vítima de um acidente numa corrida em França.Agradecia igualmente a todos os amigos e colaboradores que contribuíram para transformar os seus carros num objecto de culto dos entusiastas do "Cavallino Rampante" em todo o mundo.
NOTA: Este "post" é um resumo livre e aumentado do capítulo respeitante ao ano de 1950 da obra "L'Opera i il sogno".
Contribuído por Armando de Lacerda , Terça, 2 de Dezembro de 2008 às 18:54
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