segunda-feira, 20 de julho de 2009

OS ANOS DE OURO DE NOVA LISBOA

Ao inserir a mensagem sobre as 6 Horas Internacionais de Nova Lisboa, não posso deixar de inserir aqui um vídeo que tanto me faz lembrar aquela bela cidade onde vivi alguns anos de plena felicidade e que recordo sempre com tanta saudade.

Nele posso rever:

a FINOL - Feira Internacional de Nova Lisboa a cuja organização dediquei tanto entusiasmo;

as “6 Horas Internacionais de Nova Lisboa” que com tanta dedicação e rodeado de uma extraordinária equipa, tive o prazer de pôr de pé e divulgar pelo mundo;

o Rádio Clube do Huambo onde pude interpretar algumas personagens no seu teatro radiofónico;

as passagens de modelos, integradas nos programas da Finol;

a boite ETC que mandei construir no recinto da feira e que meu filho mais velho se encarregou de dirigir;

a minha casa, a minha filha, o meu filho mais novo e eu próprio ali aparecemos num passado tão distante, mas que continua tão perto de nós.

Anos de ouro de Nova Lisboa e anos de ouro meus que ali tive a felicidade de me realizar e deixar alguma coisa de mim próprio.

1972 - 6 HORAS INTERNACIONAIS DE NOVA LISBOA



Pequena história de uma das maiores corridas realizada em Angola.

Terminadas as "6 Horas" de 1971, imediatamente, começou a preparação das de 1972, pois era necessário impô-las definitivamente como prova internacional. Inundou-se tudo quanto estava ligado ao mundo automóvel de cartazes, selos, autocolantes e regulamentos.

O Carva, fotógrafo oficial da prova, costumava dizer, com algum exagero diga-se em abono da verdade, que havia duas coisas importantes em Nova Lisboa: Norton de Matos que fundara a cidade e as "6 Horas" que a deram a conhecer ao mundo.

Garantimos a presença de estrangeiros no colégio de comissários desportivos convidando Amadeu Girão, presidente da Comissão Desportiva Brasileira e Madame Renée Guillon-Wagner, vice-presidente da Federação Francesa do Desporto Automóvel. Esta última, apesar de todo o entusiasmo com que aceitou o convite que lhe fiz, na distribuição de prémios do Rali TAP/71, acabou por não estar presente por não ter obtido o visto de entrada em Angola.

Obteve-se o patrocínio da revista brasileira Auto-Esporte.

Mas, ao mesmo tempo que se reforçava a internacionalização da prova, outra grande dificuldade começava a levantar-se: o transporte das viaturas.

Abordada a TAP, fomos informados que não tinham condições para transportar os carros.

Contactámos, então, a South African Airways que mostrou uma enorme abertura, prontificando-se a patrocinar a prova e transportar carros e pilotos em condições verdadeiramente vantajosas para nós.

Quando pensávamos ter resolvido o problema, novo balde de água fria, ao recebermos a informação que a TAP, usando do seu direito de exclusividade, não autorizava o transporte pela South African.

"Passei-me" completamente e, num telex de 4 páginas, relatava tudo que se estava a passar ao presidente do conselho de administração da TAP, apelando para a resolução do problema.

Após dois dias sobre o envio do telex, vejo entrar pelo meu gabinete, com um ar sorridente, o meu amigo Eduardo Nascimento.Confesso que o tratei mal, dizendo: Vai-te embora que não quero ver ninguém, ligado à TAP, à minha frente.

O Eduardo respondeu-me que tivesse calma pois tinha-se deslocado de propósito a Nova Lisboa para resolver o problema e, logo ali, concordámos com as condições para o transporte de todas as viaturas e pilotos.

Mais uma vez, o Engº. Vaz Pinto não me desiludiu e graças ao seu interesse o problema foi resolvido.

Aproximava-se a data da prova e, a um mês da sua realização, tivemos a alegria de ler, na circular nº. 60 da FIA, que as "6 Horas" passavam a "prova internacional livre" o que significava que nela podiam participar pilotos qualificados pela FIA e que a sua classificação na prova pontuaria para essa qualificação.

Não podíamos oferecer melhor prenda às comemorações do 60º. Aniversário da cidade de Nova Lisboa.

De imediato divulgámos a notícia pelos órgãos de comunicação e, em seguida, recebemos um telefonema do ATCA a perguntar o que é que nos tinha passado pela cabeça para divulgar uma notícia daquelas.

É que nós assinávamos as circulares da FIA e, pelos vistos, o ATCA não e, portanto, desconhecia o que se passava.

Era a concretização de um sonho e as "6 Horas" realizaram-se com 42 pilotos e 21 carros, 7 dos quais com 14 dos pilotos transportados de avião, sendo 10 estrangeiros, entre eles 4 qualificados, e 4 do continente.

Rolf Stommelen, outro qualificado, embora estivesse inscrito não compareceu e o motor Capri enviado pela fábrica não pôde ser desalfandegado por dificuldades levantadas pelo director da alfândega.

Mas isso já não chegava para ofuscar a prova que foi um grande êxito, muito divulgado no estrangeiro e chegando o jornal "L'Equipe" a rotulá-la de o "Monte Carlo africano".

Ganha por Roger Heavens/Carlos Santos, em Chevron B/21, teve como segundo classificado Wicky Elford/Gerard Larrousse em Lola T290 que haviam comandado a prova desde o princípio, mas que avariaram a duas voltas do fim.

Na organização da prova estiveram envolvidos cerca de 300 pessoas que, em dois dias, tiveram uma actividade quase contínua.

O êxito da prova ficou a dever-se às entidades e empresas que a apoiaram, aos órgãos de comunicação que a acompanharam a par e passo, a todos os concorrentes que a valorizaram com o seu espírito desportivo e a todos que, com a sua vontade, espírito de sacrifício e conhecimentos, a edificaram e nos fazem sentir orgulhoso de nos terem dado a honra de aceitar a nossa coordenação.

Tinha-se conseguido atingir uma craveira muito elevada e mantê-la era o problema que surgia, pois este nível estava a causar muita inveja a outras organizações.

É esta história, do período mais difícil das "6 Horas". que deixamos para outro artigo, ficando agora apenas com o êxito das "6 Horas" de 1972.

Contribuído por Armando de Lacerda, Sexta, 27 de Julho às 1:26

6 HORAS INTERNACIONAIS DE NOVA LISBOA



Eles não sabem, nem sonham
Que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
O mundo pula e avança.


Na circular informativa de Novembro de 1972, a FIA publicava o seu calendário internacional para o ano de 1973.

Ao lado das "4 Horas do Estoril" e do "Grande Prémio do ACP", apareciam as "6 Horas Internacionais de Nova Lisboa".

Estas três provas eram as únicas portuguesas a que foi dada a classificação de "internacional livre".

Era o justo reconhecimento da entidade máxima do automobilismo para uma Cidade que muito fez em prol dos desportos mecânicos, projectando bem alto o nome de Angola no mundo.

Mas, para chegar ali quantas dificuldades, quantas más vontades, quantas contrariedades foi preciso vencer e ultrapassar.

É esta saga que vou tentar, embora resumidamente, contar correspondendo, assim, ao desejo manifestado por alguns foristas.

As "6 Horas de Nova Lisboa" nasceram em 1968 tendo, até 1970, como director de prova Franchi Henriques, Homem a quem o automobilismo angolano muito ficou a dever, pioneiro da modalidade em Nova Lisboa e presente em quase todas as provas realizadas em Angola.

Fui seu director-adjunto até 1970, ano em que a prova já teve participação estrangeira autorizada.

Franchi Henriques era um "bon vivant" qua aliava ao entusiasmo pelo desporto automóvel o prazer de conviver com os muitos amigos que tinha.

A organização da prova ocupava cada vez mais tempo e o Franchi começou a aborrecer-se com o tempo que esta lhe ocupava pois o seu grande prazer era a corrida em si e a convivência que a mesma proporcionava.

Após as "6 Horas" de 1970, pede a demissão de director, o Sporting Clube do Huambo faz-lhe uma grande homenagem e convida-me para dirigir a secção automóvel e, automaticamente, as "6 Horas".

Ao aceitar, prometi internacionalizar a prova e colocá-la no calendário da FIA e, com aquela promessa, desencadeei uma onda de dificuldades e incompreensões.
Estas, começaram logo que foi feito o pedido ao ATCA (Automóvel e Touring Clube de Angola) de internacionalização da prova.

Alegavam que nos bastava a categoria de "prova nacional com participação estrangeira autorizada" o que nos permitiria trazer pilotos de fora e que não podiam dar seguimento ao nosso pedido porque a designação de "grande prémio" estava reservada para Luanda como capital da província.

Respondia que apenas pretendia internacionalizá-la e vir a inscreve-la no calendário da FIA, não pretendo de forma alguma apossar-me da designação de "grande prémio" que compreendia ser reservado para Luanda.

Mas, o processo não andava e o tempo ia passando.

Foi então que resolvi escrever ao meu primeiro patrão, que era director do ACP, a expor-lhe a minha pretensão, as dificuldades que estava a encontrar e pedindo-lhe colaboração.

De imediato, recebi uma amável resposta desejando-me os maiores êxitos para a prova, mas que o processo teria que ser encaminhado através do ATCA pois o ACP, como eu devia compreender, não podia permitir ultrapassagens pela direita.

Esta foi a resposta que recebi, mas o que nunca cheguei a saber foi porque motivo, a partir dali, o processo avançou finalmente.

Penso que, embora o ACP não permitisse ultrapassagens pela direita, não deixou de ter uma certa interferência.A par deste avanço, começou o ATCA a exigir coisas que não pedia a qualquer outra organização.

Começaram por nos exigir um plano de segurança, sem o qual não podiam aprovar o regulamento.

E... o plano foi feito e apresentado tendo merecido os maiores elogios, entre os quais o do "Mundo Motorizado" que o considerou como um dos trabalhos mais perfeitos e completos no género.Gostaríamos de o descrever em pormenor, só não o fazendo para não tornar este artigo ainda mais extenso.

Estamos gratos por toda a espécie de dificuldades que nos levantaram porque, em vez de nos fazerem desistir, só serviram para nos levar a aperfeiçoar ainda mais aquilo que pretendíamos perfeito.

A imposição seguinte foi a de que as inscrições teriam de estar em poder do ATCA uma semana antes da realização da prova.Nunca o tinham exigido e nunca mais o voltou a ser.

Mas, também isso foi cumprido e respeitado, mesmo contra a vontade dos representantes daquele organismo à prova que, esquecendo o que haviam exigido, quiseram impor a inclusão de um carro não inscrito.

E, assim, chegámos às "6 Horas" de 1971.

Devido às dificuldades de embarque vários concorrentes, que haviam mostrado vontade de estar presentes, não concretizaram aquele desejo e, idos de fora, tivemos apenas dois carros.

Um Lola T/70 que, depois de várias peripécias dignas de serem contadas, lá fez a viagem do Brasil para Nova Lisboa e um Chevron B-8 que foi, por terra, da África do Sul.

Nos treinos, o Lola T/70, da dupla brasileira Norman Casari/Jan Balder, viu-se afastado da competição por avaria que não foi possível reparar e o Alfa/33, de António Peixinho/Christine Bekers, sofreu um despiste que o inutilizou para a corrida.

A prova ficava, assim, reduzida a 11 carros.

Na madrugada do dia da corrida, os dois pilotos brasileiros foram a minha casa, acordando-me às 4 horas, para proporem alugar um carro que lhes permitisse alinhar.

Sensibilizou-me aquele gesto, mas embora me custasse tive de lhes dizer que não podia autorizar porque o carro não estava inscrito e, por isso, o regulamento não permitia a sua entrada.

Também, como referimos atrás, já com os carros na grelha de partida, os delegados do ATCA quiserem impor o alinhamento de um GT/40. Apesar de todas as pressões, não o permiti.E se eu precisava de carros... mas, o regulamento tinha de ser cumprido custasse o que custasse.

A prova ganha por Mário Araújo Cabral/Hans Stuck, teve alguns momentos de emoção pela luta desta dupla com a dos sul africanos Jack Holme/Bruce Van Der Merwe.

E, assim, terminavam as primeiras 6 Horas Internacionais que, embora sem a participação que se pretendia, se impôs aos olhos do mundo como uma organização séria onde os regulamentos eram cumpridos. Isso mesmo foi referido com relevo pela revista brasileira "Auto.Esporte".

Terminadas as "6 Horas" de 1971, imediatamente começou a preparação das de 1972.
Era necessário impô-las definitivamente como prova internacional.

Mas temos que deixar isso para um próximo artigo pois este já vai muito longo.

Contribuído por Armando de Lacerda, Domingo, 22 de Julho às 12:41

domingo, 19 de julho de 2009

O SONHO E A OBRA – 1949 - AMÉRICA




É conhecido o fascínio que o sonho americano sempre exerceu em Enzo Ferrari.

Através das suas memórias, ele conta-nos como o ítalo -americano Ralph de Palma, que fez fortuna nos Estados Unidos e ganhou as 500 Milhas de Indianapolis, o impressionara, quando jovem, e pesara na sua decisão de ser piloto.

É influenciado ainda pelo encanto dos grandes turismos americanos mais conhecidos que opta pelos motores V12 para os seus primeiros carros.

É natural, pois, que nos seus objectivos estivesse também a conquista do mercado dos Estados Unidos pelos seus carros.

Porém, a sua primeira digressão extra europeia faz-se não aquele país mas à Argentina e ao Brasil.

A Argentina desde Janeiro de 1947, aproveitando a paragem das provas europeias devido ao Inverno, organizava uma temporada automobilística.

Em 1947 e 1948 a Ferrari não teve possibilidades de estar presente.

Em 1949, Adolfo Orsi, um industrial de Modena interessado na possibilidade de exportar maquinaria para a Argentina, aproveitou o convite que lhe fora dirigido para enviar três Maseratis aquela temporada, tripulados pelos pilotos Ascari, Villoresi e príncipe Bira.

Ferrari que nutria grande rivalidade com "os do outro lado da Via Emília", (a Scuderia Ferrari quando foi criada instalou-se na Via Emília e a Maserati encontrava-se a uma pequena distância do outro lado da via e daí a expressão não mais esquecida de como era referenciada a equipa rival) e como dispunha agora de automóveis de facto competitivos, decidiu não perder a oportunidade de também estar presente com uma pequena representação.

Assim, foi preparado um monoposto de 1 500 cm3, um motor sobressalente de dois litros e uma caixa com peças e ferramentas que seguiram com os mecânicos Storchi e Salvarani e o piloto Nino Farina.

Esta pequena representação, participou em quatro corridas na Argentina e duas no Brasil, obtendo uma vitória e um segundo lugar.

Nestas provas, o chassis apresentou alguns problemas de resistência e suspensão mas o motor mostrou-se bastante fiável fazendo quatro corridas, pois apenas em duas foi usado o de dois litros com compressor destinado à fórmula livre e nenhuma das desistências ocorridas foi originada por falhas de qualquer dos motores.

Estas corridas tiveram em vista, além de desenvolver o monoposto face ao campeonato de fórmula 1 que se aproximava, tornar conhecida a marca em dois países com forte presença italiana.

A EPOPEIA DO 166
1949 pode-se considerar o mais brilhante do primeiro Ferrari de série.

De facto, o 166 na versão Mille Miglia com carroçaria "barqueta", nesse primeiro ano de intensa actividade, ganha todas as provas europeias de resistência.

Começa por repetir a proeza do ano transacto ao vencer o Targa Florio, circuito da Sicília disputado a 20 de Março, com Clemente Biondetti que, desta vez, tinha como segundo piloto Benedetti, à média de 81,53 km/h.

Isto foi apenas o princípio pois Biondetti, um dos melhores estradistas de todos os tempos, a 24 e 25 de Abril vence as Mille Miglia, prova que terminou com 182 dos 303 concorrentes inscritos.

Acompanhado do mecânico Ettore Salami, Clemente Biondetti percorreu os 1 593 quilómetros desta clássica competição a uma média superior a 131 km/h, derrubando o seu recorde do ano anterior que tinha sido de 121 km/h.

Mas as vitórias dos 166 não terminam aqui pois, a 26 de Junho, outro grande piloto, Luigi Chinetti, numa viatura propriedade do britânico Lord Seldson que fez equipa com ele, ganha as míticas 24 Horas de Le Mans batendo uma série de pilotos ingleses e franceses conduzindo carros de cilindrada superior.

Esta vitória não satisfez Chinetti que, apenas duas semanas depois, a 10 de Julho, se apresenta nas clássicas 24 Horas de Spa, desta vez acompanhado do piloto francês Jean Lucas.

No difícil e perigoso circuito das Ardenas, a sua 166 MM percorre os 3 033 quilómetros à média de 126,613 km/h, vencendo a corrida.

Mas o motor 166 honrava também as versões monoposto de fórmula 2 de alimentação atmosférica e a de fórmula livre com compressor.

Gigi Villoresi impõe-se no Grande Prémio de Bruxelas, no mês de Maio, e novamente no Grande Prémio de Roma que ganha, seguido de Tarufi, Cortese e Riguetti todos com carros iguais.
Ascari vence em Bari, seguido de quatro Ferraris idênticos.

PILOTOS OFICIAIS E CLIENTES
Entretanto, em Maranello, o trabalho prosseguia em ritmo acelerado, não só porque havia de preparar os carros para as numerosas competições de todas as categorias como porque estava em curso a afinação do motor de fórmula 1 sobrealimentado como o atmosférico com aumento de cilindrada e potência destinado a carros de grande turismo e desporto.

Durante a época desportiva de 1949, a Ferrari participou num elevado número de competições quer através dos seus pilotos, quer dos seus clientes a quem era garantida a assistência em termos de afinação e estratégia.

A descrição completa de todas as corridas foi reunida num anuário destinado a tornar-se um clássico e intitulado "Victoires - Affermazioni - Victories" onde constam 51 corridas com 32 vitórias, 19 segundos lugares e 12 terceiros, com 149 carros inscritos o que dá uma média de quase 3 por corrida.

O anuário alternava fotografias dos melhores pilotos com páginas de publicidade dos fornecedores de componentes para os carros de Maranello.

Enzo Ferrari estava consciente que os melhores aliados eram os fornecedores de componentes, além dos combustíveis e lubrificantes. Este conceito prevalece ainda válido passados mais de sessenta anos.

Merece a pena lembrar que todos os automóveis, sucessos e anuários nasceram de uma pequena indústria no coração da Via Emília com uma só linha telefónica, Maranello 94, número que ainda hoje se encontra no 949111 da moderna e sofisticada central da Ferrari.

O novo campeonato do mundo aproximava-se e a Ferrari tinha conseguido o êxito de ter na sua "scuderia" dois dos mais famosos pilotos da época: Ascari e Villoresi.

Farina, entretanto, havia regressado à Alfa Romeo e ninguém sabia o que Fangio faria. A única certeza é que dominava com facilidade qualquer carro que conduzisse e poderia ganhar corridas na Maserati ou na Ferrari desde que integrado em qualquer das equipas.

O 125 GP TIPO 49
Os monopostos para a fórmula 1 estavam prontos com a primeira versão de 125 GPC (Grande Prémio com Compressor).

Ascari tinha vencido o Grande Prémio da Suiça, a 3 de Julho, classificando-se Villoresi em segundo.

No Grande Prémio de França, a 17 de Julho, Peter Whitehead obteve um terceiro lugar e, a 31 de Julho, Villoresi vence o Grande Prémio da Holanda.
No International Trophy Race, a 20 de Agosto em Silverstone, contra uma concorrência qualificada da Maserati, Era e Talbot, Ascari vence e Villoresi fica em terceiro.

A 25 de Setembro, Peter Whitehead vence o Grande Prémio da Checoslováquia.

Mas o grande problema, e que muito preocupava Enzo Ferrari, era que a Alfa Romeo iria apresentar, no campeonato mundial de pilotos de 1950, o seu 158 e Enzo sabia que os cerca de 200 cavalos dos motores dos seus monopostos não seriam suficientes para fazer frente à sua rival.

Foi estudada nova versão designada por 125 GPC tipo 49 que divergia da utilizada nas primeiras competições do ano.

Alterado o chassis de forma a obter uma maior estabilidade, melhoradas as suspensões e um novo motor com compressor de dois estágios, permitiram um desenvolvimento que garantia pelo menos 245 cavalos.

Foram preparadas duas unidades da nova versão para o Grande Prémio de Itália (Europa), realizado em Monza a 11de Setembro, para Ascari e Villoresi e três carros da versão anterior para Sommer, Bonneto e Whitehead.

Ascari partiu da pole e venceu, repetindo a proeza de seu pai em 1924 que havia ganho com um Alfa Romeo.

Villoresi partiu a caixa, mas o verdadeiro problema não foi revelado.

A melhor volta de Ascari tinha sido de 2'06"4/5, quando o melhor tempo do Alfetta 158 realizado em testes (a Alfa não esteve presente em Monza) por Consalvo Sanesi era de 2'00"2/5.

Os 125 GPC tipo 49 eram muito mais rápidos que os do tipo 48 pelo que o resultado da corrida era encorajador mas, na realidade, face às notícias filtradas de Milão as perspectivas para 1950 eram preocupantes.

Mas, Ferrari tinha sempre algum truque que lhe permitia tirar um trunfo da manga.

O MOTOR LAMPREDI
O jovem Lampredi apostava num motor atmosférico V12 de 4,5 litros que seria a melhor solução técnica para a fórmula 1, perfeitamente capaz de bater os oito cilindros de 1 500cm3 super comprimidos da Alfa Romeo, e que poderia fazer o seu aparecimento em 1950, dadas as dificuldades encontradas no desenvolvimento do motor sobrealimentado.

Assim, Lampredi, dada a sua experiência na indústria aeronáutica, propôs a Ferrari que se seguisse um caminho contrário ao que vinha sendo seguido, proposta que considerava inteiramente possível.

Ferrari aceitou a solução apresentada não só por causa do potencial de competição mas, também, porque via nisso uma abertura para os grandes carros ideais para o mercado americano que Chinetti estava pronto a abrir.

Este motor V12 seria, assim, a primeira criação do novo coordenador para a primeira metade de 1950.

Era um projecto inovador com uma carcaça de alumínio oca mas, contudo, bem resistente e capaz de suportar as forças de torção geradas dentro do bloco de cilindros, sem se deformar.

A primeira versão do novo motor tinha uma cilindrada unitária de 276,86 cm3 e total de 3822 cm3 para o qual foi escolhido o número 275 para definição do tipo, arredondando o número, o que aliás sempre era feito, para torná-lo mais fácil de recordar.

PRODUÇÃO E VENDA
Com toda a sua actividade desportiva e de investigação, era quase um milagre ter recursos para ainda fabricar carros para a sua clientela pequena mas crescente.

Esta possibilidade devia-se aos métodos organizativos da Ferrari e à disponibilidade dos novos clientes serem, na prática, pilotos de testes dos novos modelos.

Os nomes de Sterzi, Besana, Bianchetti e Vallone estão entre os primeiros dos seus clientes que tentavam correr com os seus carros.

Havia outros como Chinetti e Cornacchia que compravam carros para correr, mas também para fornecer aos seus clientes.

Os dados de 1949 indicam 21 carros produzidos para venda, além dos protótipos de novos modelos e versões de corrida.

A série de vitórias alcançadas no seu terceiro ano de existência é já uma significativa indicação da importância que o "Cavallino" iria ter no mundo automóvel

NOTA: Este "post" é um resumo livre e aumentado do capítulo respeitante ao ano de 1949 da obra "L'Opera i il sogno".

Contribuído por Armando de Lacerda , Terça, 25 de Novembro às 15:59

MIRA GODINHO – OBREIRO IGNORADO DAS 6 HORAS



Pequena "estória" de alguém a quem as "6 Horas de Nova Lisboa" muito ficaram a dever.

Hoje, vou falar de uma pessoa que, para muitos talvez desconhecida, é alguém a quem as “6 Horas de Nova Lisboa” muito ficaram a dever: Fernando Mira Godinho.

Conheci o Mira numa reunião de emergência em que se discutia o futuro das “6 Horas” e a sua possível condenação à morte.

A primeira edição da prova dera um prejuízo de vinte contos e o presidente do Sporting do Huambo, adepto apenas do futebol e que só via cifrões, não dava autorização para a sua continuação.
Estava-se naquela discussão quando o Mira, usando da palavra, garantiu que arranjaria aquela importância em publicidade e que, se o não conseguisse, punha o que faltava do seu bolso.

A princípio, por aquela conversa, pensei que seria algum angariador de publicidade e mal pensava eu, naquela altura, que se iria tornar no meu melhor colaborador e no meu maior amigo.

A partir dali, foi-se cimentando uma amizade muito grande e passámos a ser companheiros em todos os bons e maus momentos.

O Mira arranjou a publicidade num valor que excedeu a importância em causa, a segunda edição da prova realizou-se e, passado algum tempo, assumiu a presidência da direcção do Sporting.

Onde tínhamos tido um opositor à realização da prova passámos a ter alguém com quem podíamos contar em todas as circunstâncias.

Após a terceira edição, o Mira percebeu da necessidade de imprimir um maior dinamismo e mais organização para permitir o seu progresso e pediu-me para assumir a direcção da prova dado que o Franchi Henriques se encontrava saturado.

A nossa amizade foi sempre aumentando, embora entremeada de discussões terríveis todas elas relacionadas com a organização da prova, embora fora delas continuássemos inseparáveis amigos.

É que o Mira tinha de ser mediador e o grande apaziguador entre uma direcção do Sporting que só se interessava com o lucro que a prova poderia dar, pretendendo ganhar o máximo gastando o mínimo, e a direcção da corrida que pretendia o céu e a terra e, para isso, exigia que as receitas conseguidas com as provas fossem empregues em proveito das mesmas.

Como uma bola de ping-pong, o Mira enfrentava e tentava convencer a direcção a investir o mais possível e aguentava com as minhas fúrias que queria sempre mais e mais.

As discussões eram de tal forma violentas que chegámos a fazer um pacto de que, no dia a seguir às “6 Horas”, esqueceríamos tudo que pudéssemos ter dito um ao outro.
E foi sempre assim até à minha saída da direcção da corrida que abalou, temporariamente, as nossas relações, pois zangámo-nos e deixámo-nos de falar, mas a nossa amizade, embora o não parecesse, nunca deixou de existir.

Com a minha saída, o Mira reconhecendo que não tinha capacidade técnica para assumir a direcção da prova, teve a humildade de se dirigir ao ATCA e pedir à Comissão Desportiva que tomasse a direcção da mesma.

Foi ele o verdadeiro obreiro das “6 Horas” terem atingido a projecção que alcançaram, salvando-as primeiro da sua morte prematura, promovendo, em determinada altura, alterações para que atingissem maior dinamismo e projecção, batalhando depois, junto dos restantes membros da direcção, para obter as condições financeiras que permitissem que as minhas ideias se pudessem concretizar e tomando medidas, após a minha saída, para que a prova pudesse continuar.

Durante alguns anos, mantivemo-nos zangados e nem sequer me despedi dele quando regressei a Portugal.

Mas, apesar disso, a nossa amizade nunca diminuiu e, um dia, o Mira apareceu-me em Évora e deu-se a nossa reconciliação.

Abraçámo-nos como se nos tivéssemos visto na véspera e continuámos amigos até aos dias de hoje.

Na semana passada recebi um telefonema seu. Estava radiante!A convite do sobrinho, tinha voltado à sua querida Angola que ele tanto ama e ali tinha passado dois meses, em Luanda e no Huambo.

Dera entrevistas à Rádio Nacional de Angola e à Rádio Huambo sobre os seus tempos de futebolista e basquetebolista, mas sobretudo sobre as “6 Horas”.
No Huambo, as pessoas com quem falara referiam-se com entusiasmo às “6 Horas”, chegando alguém a dizer-lhe que já não o deixavam sair de lá sem voltar a fazer, de novo, aquela prova.

E o Mira justificava-se dizendo que as “6 Horas” não se faziam em meia dúzia de dias e que, antigamente, levavam um ano a ser organizadas, que não tinha ali a equipa que fizera a prova, que o asfalto existente não se prestava à sua realização, em conclusão que era um sonho ainda difícil de concretizar.

Fico feliz pela alegria que o Mira sentiu por esses dois meses na sua querida terra e por todo o entusiasmo que o rodeou.

Feliz e impressionado!

Impressionado como, passados trinta e tal anos, as “6 Horas” continuam bem vivas e se falam delas com entusiasmo.

Impressionado quando encontro pessoas, que eram crianças na altura, cheias de recordações e falando com entusiasmo das corridas daqueles tempos.

Impressionado quando, após tantos anos difíceis e de sacrifício porque Angola passou, o amor pelos automóveis não morreu, continua bem vivo e, a pouco e pouco, por todo o país vão surgindo corridas com o mesmo entusiasmo de outrora.

Impressionado quando tomo conhecimento que o Governador do Huambo, em reunião com a pessoa que está tentando reorganizar este desporto naquela cidade, lhe pede que ponha de pé as “6 Horas” no mais curto espaço de tempo. E. ao impressionar-me desta forma, o meu pensamento vai para todos aqueles que disputando as corridas nas pistas, na organização das provas com mais ou menos defeitos, nos bastidores dando-lhe todo o apoio necessários ou nos jornais e na rádio promovendo a sua divulgação, tornaram possível que este entusiasmo se mantenha vivo ao fim de tantos anos.

Aqueles homens com quem tive a honra de conviver e de granjear amizades, sem sequer darem por isso, estavam a fazer história.

Eles fizeram de facto história… história que se mantém bem viva nos dias de hoje.

E entre esses homens está o Fernando Mira Godinho.

Contribuído por Armando de Lacerda, Quinta, 27 de Dezembro de 2007 às 11:05

Passado algum tempo de ter inserido este “post” no fórum do AutoSport tive de voltar a falar dele

UM DOS PILARES DAS "6 HORAS INTERNACIONAIS DE NOVA LISBOA" REGRESSA AO HUAMBO

Há tempos, coloquei aqui um "post" em que, a propósito de um telefonema que havia recebido do meu Amigo Fernando Mira Godinho, relatei as férias que ele passara em Angola e contava como ele tinha sido um verdadeiro pilar na construção das "6 Horas Internacionais de Nova Lisboa".

Há dias, recebi outro telefonema dele a despedir-se pois resolvera regressar definitivamente à sua Angola e ao seu Huambo.

Quando ali tivera de férias, aproveitara para tirar o seu bilhete de identidade de cidadão angolano e, assim, ao fim de trinta e dois anos de exílio, o Fernando regressa à sua terra de origem que tanto ama.

Senti-me feliz por ele mas, ao mesmo tempo, apoderou-se de mim uma enorme tristeza pois a distância ia afastar-nos, possivelmente, em definitivo.

Mas como, tal como dizia Fernando Pessoa, "tenho em mim todos os sonhos do mundo" despedi-me dizendo-lhe que, em breve, o iria visitar.

E o Mira feliz e sempre prestável respondeu-me: "e tens cama, mesa e roupa lavada garantida.

Sei que, apesar de ter em mim todos os sonhos do mundo, este será muito difícil de concretizar ... mas vale sempre a pena sonhar.

A última vez que estive com o Mira Godinho foi em Maio, quando o fui buscar para irmos ao encontro dos automobilistas angolanos que se realizou no Bombarral.

Ali, o António Peixinho fez questão de homenagear-me e ao Mira afirmando que nós tínhamos sido autores das melhores corridas que se realizaram em Angola.

Como foi bom o Peixinho ter tido esta lembrança pois, assim, o Fernando leva uma boa recordação de Portugal e sabe que o seu valor foi reconhecido.

O Fernando Mira Godinho regressou ao seu querido Huambo.Está um pouco depauperado e já não tem os meios e relações que tinha quando, juntos, construímos as "6 Horas". Mas tem, dentro dele, ainda muito entusiasmo e uma vida passada cheia de actividade em prol do desporto.

Que os entusiastas do desporto automóvel, que no Huambo tentam dar nova vida a esta modalidade, saibam aproveitar tudo que o Mira Godinho ainda lhes pode dar.
Será bom para o desporto automóvel e também para o Mira Godinho que bem merece.

Contribuído por Armando de Lacerda , Sábado 19, às 18:24

Quando inseri este “post” disse que o sonho era difícil de concretizar mas, em Maio passado, ele teve prestes a ser uma realidade quando na realização de corridas no Huambo, ao fim de trinta e cinco anos, houve uma movimentação em Angola para que eu tivesse presente.

E quando tudo fazia prever que o sonho se tornaria realidade a não chegada de um visto impediu que tivesse tido essa grande alegria.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

TOQUIM BARRETO - O PILOTO ESQUECIDO



NOTA DE ABERTURA:
Este artigo só foi possível graças à gentileza de Paulo Piçarra que,
correspondendo ao meu pedido, disponibilizou todas as fotografias e artigos
existentes no seu jornal.
A Paulo Piçarra e ao Diário do Sul o meu muito obrigado.


Toquim Barreto passou pelo automobilismo desportivo como um meteoro, numa curta carreira de apenas três anos, mas onde mostrou todo o seu grande entusiasmo e coragem que o poderiam ter alcandorado a um lugar muito alto se o destino não o tivesse impedido de chegar onde ele e todos nós esperávamos.

Inicia-se na competição automobilística em 1964, com 23 anos, na VI Volta a Portugal, organizada pelo clube "100 à Hora" e, perante o espanto de todos, conquista o 1º. lugar, vencendo uma prova onde era um estreante a enfrentar adversários muito mais experientes.

Numa entrevista dada ao Diário de Lisboa a 6 de Dezembro daquele ano, Toquim diz: "Sou estreante. Nunca entrei em provas, se bem que conduzo há bastante tempo.Sinceramente lhe digo: quis avaliar o prazer destas andanças. Não sabia nada disto e não queria deixar de experimentar as sensações que outros volantes têm tido. Agora não desisto mais..."

E não desistiu. Primeiro com um Porsche e depois num Ferrari 250 MM (spider Vignale) que adquiriu a D. Fernando de Mascarenhas.

Em 1955 classifica-se em 7º. lugar no G.P. de Portugal, em 10º. no G.P. de Lisboa, em 2º. na Rampa da Penha em Guimarães e em 1º., na classe, num Quilómetro de Arranque.

Em 1956, no G.P. do Porto obtém o 4º. lugar com um Ferrari 750 Monza (spider Scaglietti) adquirido também a D. Fernando de Mascarenhas.

Compra, então, um Ferrari 500 TRC com que inicia a sua carreiras internacional nas 10 Horas de Messina onde alcança um 3º. lugar ganhando a "Taça dos Novos".

Parecia estar lançada a via que o transportaria ao seio dos grandes pilotos
mundiais.

Em entrevista dada ao "Volante", em 15 de Setembro, com entusiasmo diz: "Vou para Itália, onde me demorarei poucos dias, apenas o tempo necessário para alguns treinos na Ferrari. Depois sigo para França onde no dia 23, em Saint-Etienne disputarei uma prova de circuito à qual devem correr todos os "bons" e em que eu correrei oficialmente pela Ferrari."

Perante o espanto do entrevistador, Toquim informa-o: "Exactamente pela Ferrari. Em Messina já corri pela Ferrari mas agora é verdadeiramente oficial a minha presença na equipa".

E, em resposta à pergunta do entrevistador se se tornava profissional, Toquim diz- lhe que "É essa a minha intenção. Tenho 25 anos e reconheço que posso fazer qualquer coisa interessante. Lá fora escasseiam os corredores novos: julgo que a ocasião é de aproveitar..."

Porém, o destino não quis que assim fosse e... no dia 30 de Maio, nas "6 Horas de Forez", espera-o para cortar todos os sonhos de glória deste extraordinário piloto de quem tanto havia a esperar.

Quando seguia em terceiro lugar, o carro de Piero Carini despistou-se, derruba a barreira entre as duas rectas da corrida e vem chocar, a mais de 200 km/h, com o de Borges Barreto, ocasionando a morte imediata de ambos.

O Toquim não morre motivado por qualquer falha mecânica ou humana, mas porque aquela hora e naquele local estava destinado que outro carro levantasse voo e viesse cair em cima se si pondo ponto final em todos os sonhos e projectos daquele que poderia muito bem ter sido o primeiro piloto de Fórmula 1 português com possibilidade de alcançar lugares cimeiros, pois iria correr numa equipa onde nenhum outro do seu país conseguiu chegar.

Évora inteira chorou a morte daquele filho querido da terra que depois de lhe ter proporcionado tantas alegrias com os seus êxitos lhe trazia agora o luto e a dor.

Por entre uma multidão imensa que lhe quis prestar a última homenagem, o caixão foi transportado aos ombros desde a igreja na Praça do Giraldo, no centro da cidade,até ao cemitério já fora das muralhas.

Entre as muitas flores que juncavam a sepultura, destacavam-se duas coroas pelo seu significado: a da família do malogrado Piero Carini e a de Enzo Ferrari que, assim, prestava a última homenagem a este fugaz representante do "cavallino rampante".

E, apesar do incompreensível esquecimento a que este grande piloto foi votado no seu país, no livro dos principais pilotos da Ferrari a sua fotografia lá está com a legenda, bem significativa da personalidade de António Borges Barreto, o legendário Toquim:

"...AVEVA CORAGGIO E PASSIONE: É MORTO A SOLI 26 ANNI..."

Contribuído por Armando de Lacerda , Sexta 15, às 9:40

ALFONSO DE PORTAGO – CONTO DE FADAS E TRAGÉDIA





A 12 de de Maio de 1957, faltava pouco para o Marquês de Portago se juntar, nos Estados Unidos, à sua última conquista, a actriz americana Linda Christian (ex mulher do actor Tyrone Power).

Para este aristocrata espanhol, Alfonso António Vicente Eduardo Angel Blas Francisco de Borja Cabeza de Vaca y Leighton, 17º. Marquês de Portago, a vida era um autêntico conto de fadas.

Com 1,83 m de altura e 77 kg de peso, Alfonso, que havia nascido em Londres, a 11 de Outubro de 1928, era filho de um nobre espanhol, António Cabeza de Vaca, e de uma enfermeira irlandesa, Olga Leighton, e afilhado do rei Alfonso XIII, vivera a maior parte da sua infância numa propriedade da família em Biarritz, na costa oeste de França, onde recebera uma educação exclusiva.

Gostava de música e literatura e falava várias línguas incluindo o francês, o inglês e o castelhano.

Ainda com 17 anos, podia ser encontrado em Paris onde apreciava a vida nocturna que a cidade lhe proporcionava e, quer fosse meia-noite ou dez da manhã, o seu cumprimento era sempre o mesmo: “tardes buenas”.

De Portago era extravagante, amava a aventura, perseguindo sempre belas mulheres. Mas, para além de playboy frequentador do “jet set”, era um grande desportista com residência em vários países, consoante os seus desejos.

Quando não pilotava o seu Ferrari, esquiava em Saint-Moritz ou fazia “bobsleigh” (acabava de terminar em terceiro lugar no campeonato do mundo de 1957). Era campeão espanhol de mergulho, em equitação, campeão de França em obstáculos e praticava natação a nível internacional.

Aos 17 anos havia tirado o seu “brevet” de voo, mas a organização de pilotos americanos havia-lhe retirado a licença por o considerar demasiado perigoso. Que sucedera? Simplesmente, tinha feito uma aposta com os amigos em como cruzaria, com o seu avião, uma ponte voando por baixo dela.

Jogava pólo e caçava (não apenas mulheres) e era, ainda, um excelente esgrimista.

Depois desta pequena biografia, voltemos ao trágico dia 12 de Maio de 1957, quando faltavam pouco mais de cinquenta quilómetros para o sua Ferrari 335 S cortar a meta em Brescia.

Partira às 5 h 31 m, como atesta o seu número 531, e percorrera mais de 1 400 quilómetros de estradas abertas, seguindo para o sul por Verona, Ferrara, São Martinho e Roma, antes de regressar ao norte atravessando Siena, Florença, Bolonha e Mântua para regressar a Brescia.

Cidades e aldeias eram atravessadas pelos pilotos, a grande velocidade, num percurso invadido por dezenas de milhares de espectadores que se aglomeravam nos passeios.

As MIlle Miglia era uma festa! Uma autêntica festa do povo.

Em dez anos, a Ferrari ganhara oito vezes, só sendo batida por dois “monstros sagrados”: o campeão italiano de F1 Alberto Ascari em Lancia, e o diabólico inglês Stirling Moss pilotando um Mercedes.

Naquele ano, as máquinas de Enzo Ferrari magistralmente conduzidas por Piero Taruffi (o futuro vencedor), Wolfang von Trips, Alfonso de Portago, Peter Collins e Olivier Gendebien, dominavam a situação. Qualquer um deles estava em condições de ganhar e prestar homenagem a Eugénio Castelotti, o vencedor da edição anterior, falecido dois meses antes quando testava, em Modena, o seu monolugar F1.

Infelizmente, às 16 H 15 m, perto de Mântua, a tragédia estava à espreita. Lançado a 280 km/h, o Ferrari 531 saía da estrada e terminava a sua louca corrida em cima da multidão. O piloto e o seu navegador, o americano Edmund Nelson morreram, assim como mais dez espectadores, entre os quais cinco crianças.

Este episódio, um dos mais trágicos da história do desporto automóvel, após o de Le Mans em 1955, levou a que as autoridades italianas, face ao coro de protestos que se levantaram, proibissem definitivamente as Mille Miglia.

Enzo Ferrari, ver-se-ia envolvido num processo que durou quatro anos, findo os quais teve a satisfação de se ver absolvido, a compensá-lo do grande desgosto que sentiu com este acidente.

E, assim, terminou esta mítica prova que despertava o entusiasmo de milhares de pessoas e que, na opinião de Enzo, era “la corsa più bella del mondo”.


FONTES: Ferrari – 60 ans de scuderia En.wikipedia.org www.velocetoday.com