terça-feira, 8 de dezembro de 2009

RECORDANDO O NOSSO CASAMENTO

Como estávamos felizes, querida Teresinha, há cinquenta e seis anos!

Ao fim de um ano, em que nem um só dia deixámos de nos corresponder, o nosso sonho realizou-se com a concretização do nosso casamento.

E durante perto de cinquenta e seis anos vivemos uma felicidade enorme enfrentando tantas contrariedades e dificuldades mas também alegrias enormes como as do nascimento dos nossos filhos.

Em ti, tive sempre uma companheira com uma coragem invulgar dando-me apoio e aturando todas as minhas manias que tantas vezes te deixaram menos acompanhada para me entregar às coisas a que me dedicava como os automóveis e o teatro.

Mas sabia que ao chegar a casa te tinha sempre à espera dando-me alento para enfrentar todas as contrariedades e força para continuar.

Como fomos felizes, meu querido amor.

Hoje, é o primeiro aniversário do nosso casamento em que não estamos juntos e como isto é doloroso.

De manhã, quando dei os parabéns e desejei um dia feliz ao nosso Armando, pois também hoje ele faz anos de casado, que esforço enorme tive de fazer para ele não se aperceber que eu chorava.

Sempre desejei morrer antes de ti e só agora percebo como estava a ser egoísta com este desejo pois iria submeter-te a uma dor muito grande e compreendo porque, quando falávamos nisso, dizias que se tal sucedesse te matarias de seguida.

Infelizmente eu não tenho coragem para o fazer, mas vontade não me falta.

Até quando isto durará meu amor adorado que recordo todos os dias com uma saudade cada vez maior.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

SAUDADE

Ai, querida Teresinha, como é diferente o dia de hoje com o de há cinquenta e sete anos atrás.

Aquele foi um dia de sol em que o frio não se fazia sentir porque era aquecido pelo calor de um amor muito grande que nascia e que duraria para todo o sempre!

O de hoje é um dia triste, frio e chuvoso, que acompanha a minha grande dor de já não te ter junto de mim.

Na nossa campa, deixei-te um ramo de rosas e ali estive a fazer-te companhia.

Estavas tão perto e tão longe!

Até quando, meu querido amor?

Há alguns meses, procurando um papel, na nossa casa, encontrei o bilhete que me escreveste a dar-me os parabéns dos meus setenta e dois anos.

Cheio do carinho que sempre me dedicaste, lamentavas “como tudo passou tão depressa.

Foi, de facto, assim. Tudo passou como um meteoro tal a felicidade que sentíamos em estarmos juntos.

Hoje, estou sozinho, apesar do amor e aoio dos filhos, e não há um só dia em que não te recorde com uma saudade tão grande que faz doer e encherem-se os meus olhos de lágrimas.

Cada dia que passa tudo se torna cada vez mais difícil.

Até quando, meu amor adorado!

domingo, 8 de novembro de 2009

FREDDY VAZ – O PILOTO QUE TINHA UMA PRESSA ENORME DE VIVER




Freddy Vaz era um jovem alegre, com um entusiasmo contagiante e uma extraordinária ousadia que nem sempre respeitava as regras do bom senso e os limites de segurança.

Nas provas, abusava da sua perícia e queria sempre mais e mais como se tivesse uma pressa enorme de viver.

Vi-o correr apenas em três provas.

A primeira, nas “6 Horas” de 1968 tripulando um Volvo.
Ao passar na meta, no fim da primeira volta, comandava já, destacadamente, a prova. Mas, na segunda volta já não passou. Exigira demasiado do carro que não resistiu e ficou parado.

Voltei a vê-lo no Pequeno Circuito do Huambo, num Lótus 23, em que comandou a prova durante várias voltas até ter de parar nas boxes, por avaria, onde ficou retido durante várias voltas.

Quando retomou a prova, lançou-se numa velocidade desmedida à conquista do impossível que era recuperar o comando. Mas ele não pensava assim e cada vez acelerava mais, secundado pela sua boxe que, com o mesmo entusiasmo, o incitava a andar mais e mais.

A última vez que o vi foi nas “6 Horas” de 1969 em que a sorte o traiu, não acompanhando a sua fogosidade e, infelizmente, para ele a prova não durou seis horas.

Mas, vejamos como tudo se passou.

Admirámo-nos de, entre as inscrições, não estar a ficha do Freddy mas, naquela altura, era habitual os concorrentes aparecerem antes dos treinos e fazerem, então, as suas inscrições

Mas, nos treinos, o Freddy também não apareceu e pensámos que ele não participaria na prova.

Já na sede do Sporting, quando estavam praticamente concluídos os trabalhos do dia, ele apareceu finalmente mostrando vontade de alinhar na corrida.

Segundo o regulamento da prova, tal não era possível mas o Franchi Henriques, sempre com o seu feitio prestável e desejoso de satisfazer a vontade de toda a gente, pediu-me que redigisse um aditamento que permitisse o seu alinhamento.

Confesso que o fiz contrariado porque entendia que não se devem fazer aditamentos para beneficiar alguém e, assim, elaborando uma redacção que permitia o alinhamento no último lugar da grelha a qualquer carro e piloto que não tivesse efectuado treinos, acrescentei “desde que tivesse o consentimento expresso de todos os outros concorrentes”.

E, o Freddy, lá foi obter essa autorização, regressando com a mesma assinada por todos os pilotos inscritos.

Resolvido este assunto, outro problema surgiu: não tinha alojamento e os hotéis estavam todos cheios.

Conseguimos alojamento numa casa particular, mas o Freddy alegava que estava habituado a ficar em hotéis e não aceitava a solução encontrada.

Eu que já estava aborrecido com tanta exigência e, embora simpatizasse bastante com aquele jovem, “passei-me” e, um pouco duro, disse-lhe: Olha! O melhor é voltares para Benguela pois não fazes cá falta nenhuma.

Mas, este incidente depressa foi resolvido pois o Chico Barbosa aceitou que ele ficasse no seu quarto onde dispunha de duas camas.

Com o meu feitio, um pouco intransigente, sem o saber, estava a tentar evitar o encontro que o Freddy iria ter no dia seguinte, mas tudo se ia proporcionando para que, de facto, ele acontecesse.

O Freddy alinhou, correu com a sua habitual vivacidade e quando se encontrava na última volta, antes de entrar nas boxes para mudar de piloto, o carro embateu no lancil do passeio, despistou-se e foi raspar a parede do edifício dos Correios.

Não foi grande embate pois o carro mal ficou amachucado, tendo apenas a pintura raspada, e nada fazia prever um desenlace fatal. Mas, ele havia cometido duas imprudências: desapertara o capacete e levava o vidro da porta aberto.

No embate, bateu com a cabeça na parede. Tivesse ele o capacete apertado e a janela fechada e, estamos certos, nada do que sucedeu teria acontecido.

Ainda foi pelo seu pé para a ambulância que o conduziu ao hospital, mas, passado algum tempo, tomámos conhecimento que havia falecido.

O resto da prova desenrolou-se num ambiente de grande consternação, parecendo que o final da prova nunca mais chegava, mantendo-se um grande silêncio sobre o sucedido.

A festa da distribuição dos prémios foi cancelada e deu-se tudo por terminado após a ida ao pódio dos vencedores, para imposição da coroa de louros, e a respectiva volta de honra.

Só nessa altura se deu conhecimento da triste notícia.

A urna do malogrado Freddy Vaz foi colocada na sede do Sporting Clube do Huambo onde foi velada durante toda a noite.

Os vencedores das “6 Horas, José Lampreia e Álbio Pinto, ali compareceram a depor, junto à urna, as coroas de louros que haviam conquistado.

Na segunda-feira, a urna seguiu para Benguela, acompanhada de dezenas de carros.

Foi verdadeiramente impressionante ver, na descida da serra já de noite, as dezenas e dezenas de faróis por ali acima.

Em Benguela, ficou em câmara ardente numa das colectividades (já não me lembro qual) de segunda para terça-feira, dia em que se realizou o funeral.

A direcção das “6 Horas” esteve representada pelo Mira Godinho, pelo Franchi Henriques e por mim, nesta jornada tão triste do automobilismo angolano.

A imprudência de um capacete desapertado e de uma janela com o vidro aberto custou a vida a um jovem que poderia ter sido um grande piloto na história do automobilismo angolano quando a sua extraordinária perícia passasse a obedecer ao raciocínio, moderando a sua fogosidade que punha em risco a sua própria vida e a dos carros.

Em mim perdura a imagem de um jovem alegre, generoso e um pouco irreverente como é apanágio da juventude. Apesar de, naquela noite, ter sido um pouco duro e indelicado, nutria por ele uma grande simpatia e recordo sempre aquele dia com grande tristeza.

FREDDY VAZ TINHA UMA PRESSA MUITO GRANDE DE VIVER E DE CORTAR A META FINAL RAPIDAMENTE!

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

RECOMEÇO!

Durante dois meses, por falta de tempo e, muito principalmente, de disposição, estive ausente do meu blogue.

E durante este espaço de tempo tanta e tanta coisa houve para relatar e que fui deixando sempre para o dia seguinte.

Estive em S. Tomé e tantas recordações para relatar. Através de um apontamento no blogue tive oportunidade de conhecer membros da família que desconhecia e com eles ter o prazer de contactar através da net.

Foi muito o que deixei por dizer.

Vou retomar este cantinho de recordações.

Além dos momentos recentes que tenho para relatar, quero continuar aquilo que tinha projectado: deixar aqui arquivados alguns dos textos sobre o desporto automóvel espalhados pelos vários fóruns; guardar as traduções que fiz do “Sonho e a Obra”, assim como traduzir o que falta para ficar arquivada a história do “cavallino rampante” e escrever algumas memórias de teatro.

O projecto é grande e o tempo vai faltando para o concretizar. Não vou perder mais tempo.

Metamos, pois, mãos à obra!

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

MOVIMENTO RENOVADOR DO TEATRO EM PORTUGAL



1945, com a derrota da Alemanha, a Europa sai da longa noite de seis anos de guerra e vive uma euforia que chega a Portugal. Um novo dia raiava após uma longa e medonha noite.

Recordo-me quando, com o entusiasmo dos meus quinze anos de idade, andei até de madrugada correndo de uma manifestação para outra pois elas surgiam por toda a parte.

É difícil descrever toda a alegria pelas ruas, pelas cervejarias completamente cheias, como por todo o lado se viveu em Lisboa aquele dia que só terminou quando o sol do dia seguinte já ia alto.

Só quem viveu aqueles momentos, loucos de alegria, pode sentir o que foi o renascer da esperança num mundo que vivera horas de grande amargura e dor mas que acordava para um novo dia que se esperava livre da opressão e do medo.

Também em Portugal o governo, para sobreviver à vaga democrática que alastrava por toda a parte, iniciou um processo de relativa abertura o que, durante cerca de quatro anos, resultou num abrandamento do regime repressivo até então vivido.

Este abrandamento originou o aparecimento de várias acções de carácter cultural e político que pretendiam alterar o atraso em que vegetávamos.

O teatro não era excepção à modorra que abraçava este país e nos palcos, com excepção do Teatro Nacional D. Maria II, prevalecia a baixa comédia em espectáculos que pouco dignificavam as companhias profissionais e que, infelizmente, era também seguido pelos grupos amadores.

Resultante de um movimento desencadeado por António Pedro no Diário de Lisboa, verifica-se uma autêntica revolução contra a situação que se vivia na maior parte dos palcos portugueses dando origem ao surgimento de vários grupos donde saem novas ideias, novos actores, encenadores e dramaturgos.

Liderado por Gino Saviotti surge o Teatro do Salitre que inicia Artur Ramos na encenação, actores como Armando Cortês, Canto e Castro, Rogério Paulo e a revelação de novos dramaturgos como Luís Francisco Rebello.

No antigo Clube Lisbonense, Pedro Bom forma um grupo de teatro experimental que lança Paulo Renato, Glicínia Quartin e minha tia Cândida de Lacerda.

No Grupo Dramático Lisbonense, Manuela Porto com o seu teatro revela Gina Santos.

Na Sociedade de Instrução Guilherme Cossoul Jacinto Ramos e José Viana, para ultrapassarem o teatro convencional que o grupo dramático existente naquela instituição praticava, resolvem formar outro grupo para acrescentarem o teatro neo-realista. Daqui virão a sair vários artistas como Varela Silva, Raul Solnado, Henrique Viana e Manuel Cavaco.

Na Brasileira do Rossio, João Villaret reunia uma tertúlia e os seus recitais de poesia empolgam as pessoas. Estes e os realizados por Manuela Porto e Maria Barroso, outras duas grandes declamadoras, despertam o gosto pela poesia e provocam a edição de poemas portugueses.

Deste movimento cultural saíram actores, encenadores e dramaturgos que fazem renascer o teatro e dão origem mais tarde a outros agrupamentos de grande importância de que se destacam o Teatro Moderno de Lisboa, o Teatro Experimental do Porto, o Teatro Experimental de Cascais, o Teatro do Povo do Mestre Francisco Ribeiro, mais tarde Teatro Nacional Popular e o Grupo 4.

Também importante foi o papel dos teatros universitários como o T.E.U.C, o C.I.T.A.C., O Grupo Cénico da Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa e o Grupo Cénico da Universidade de Direito do Porto, assim como dos grupos de amadores como o Grupo de Teatro de Campolide de Joaquim Benite que se transformou, mais tarde, na Companhia de Teatro de Almada, os grupos de teatro das Caldas da Raínha e de Leiria, o Grupo da Sociedade Joaquim António de Aguiar de Évora e “O Proscénium” – Grupo de Teatro do Sindicato Nacional dos Empregados de Escritório do Distrito de Lisboa de onde saiu a actriz Adelaide João.

Foi extraordinariamente valioso o papel desempenhado por este conjunto de instituições e pessoas que enfrentando uma rigorosa censura ainda por cima composta de elementos sem qualquer espécie de cultura, conseguiram renovar o teatro em Portugal dando a conhecer algumas das melhores peças e autores.

Consideramos que o papel por eles desempenhado, apesar de todas as dificuldades que enfrentaram, foi muito mais importante do que o realizado após o 25 de Abril que ficou muito aquém das expectativas face às condições de que passaram a dispor.

É destes agrupamentos e pessoas que pensamos falar numa série de artigos futuros.

NOTA: A fotografia que ilustra este artigo é da “Castro” de António Ferreira levada à cena, já na década de sessenta, pelo Teatro Experimental de Pedro Bom, com um excelente elenco de que recordo Paulo Renato, Vasco de Lima Couto e duas irmãs, então muito novas, Irene Cruz e Henriqueta Maia.
Pela mão da ama, minha tia Cândida de Lacerda, está o meu filho mais velho que interpretou a personagem de um dos filhos de Inês de Castro. E como a peça foi transmitida pela RTP recebeu “cachet” coisa que eu nunca tive apesar de ter entrado em várias peças.

domingo, 23 de agosto de 2009

MORREU MORAIS E CASTRO



O Fazedor de Teatro de Thomas Bernhard, encenação de Joaquim Benite,Companhia de Teatro de Almada

Os sábados começam a ser aziagos para o teatro português e, mais uma vez, este se encontra de luto com a perca de mais um dos seus actores.

Depois de Raúl Solnado, também Morais e Castro morre num sábado, no Instituto Português de Oncologia onde se encontrava internado há um mês.

Nos últimos tempos tem-se assistido a grandes perdas e, a pouco e pouco, vai desaparecendo uma geração que desempenhou um papel muito importante na renovação do teatro em Portugal.

José Armando Tavares de Morais e Castro nasceu em Lisboa a 30 de Setembro de 1939 e desde muito pequeno começou a frequentar o teatro, estreando-se no palco com o Grupo Cénico do Centro 25 da Mocidade Portuguesa, quando ainda era estudante liceal.

O ambiente cultural que se vivia no seio da sua família despertou-lhe o gosto pela carreira teatral, mas o pai (que tive o prazer de conhecer quando ele dirigia o grupo cénico da Philips Portuguesa onde era director) apesar de, também, grande amante de teatro, foi peremptório ao dizer-lhe que poderia seguir a carreira que idealizara,desde que tirasse uma licenciatura.

Licencia-se em direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa mas, quando em Julho de 1964 termina o seu curso, já tinha contracenado com actores como Carmen Dolores, Rogério Paulo, Armando Cortez, Fernando Gusmão, Armando Caldas, Glicínia Quartin, Paulo Renato, e outros no Teatro Moderno de Lisboa.

Nessa companhia integrou o elenco de várias peças entre as quais "O tinteiro", de Carlos Muñiz, e "Humilhados e Ofendidos", de Dostoievski, mas a sua a estreia profissional já havia ocorrido em 1956, no Teatro do Gerifalto, na “A Ilha do Tesouro” com direcção de António Manuel Couto Viana.

Foi, porém, no Teatro Moderno de Lisboa, onde esteve de 1961 a 1965, que adquiriu mais conhecimentos o que o levava a dizer que “o TML tinha sido a sua formação universitária em teatro”.

Em 1967 fundou o Grupo 4 com Irene Cruz, João Lourenço e Rui Mendes e que ele considerava “Um grupo fundamental na História do Teatro Português”.

De facto, o Grupo 4 que edificou o Teatro Aberto, teve grande importância no panorama teatral português pois representou autores como Peter Weiss, Berthold Brecht, Peter Handke e Boris Vian e encenou "É preciso continuar", de Luiz Francisco Rebello.

Em 1985 integrou o elenco da comédia "Pouco Barulho", com Nicolau Breyner, passando depois pela Companhia Teatral do Chiado onde, ao lado de Mário Viegas, integrou o elenco de "À espera de Godot", de Samuel Beckett.

Em 2004, dirigido por Joaquim Benite, interpretou "O fazedor de teatro", de Thomas Bernard, com a Companhia de Teatro de Almada, que lhe valeu a Menção Honrosa da Crítica nesse ano

Participou ainda nas décadas de 1980 e 1990 em novelas e séries portuguesas de televisão de que se destaca “Patilhas & Ventoinha”. Entre 1996 e 1998 popularizou-se na interpretação do professor em "As lições do Tonecas".

Lado a lado com a vida de actor, Morais e Castro exerceu advocacia e manteve uma forte actividade política e sindical.

Com a sua morte desaparece alguém que tinha uma grande paixão pelo teatro e pelos ideais políticos que, desde muito novo, abraçara.

Apesar de não perfilhar das suas ideias políticas, é com muita tristeza que vejo desaparecer alguém que muito admirava pelo seu amor ao teatro e pela sua integridade como Homem.

sábado, 22 de agosto de 2009

O SONHO E A OBRA -1951 - Nomes, números e especificações técnicas




A EMPRESA
Tipo de empresa - Firma em nome individual
Titular - Enzo Ferrari
Director técnico - Aurélio Lampredi
Director desportivo - Federico Giberti
Automóveis construídos - 33
Empregados - 260


PILOTOS COM PARTICIPAÇÃO OFICIAL
Alberto Ascari
Franco Cortese
José Froilàn Gonzalez
Francisco Landi
Dorino Serafini
Antonio Stagnoli
Piero Taruffi
Luigi Villoresi

GRANDES PRÉMIOS DE F1 GANHOS E OUTRAS VITÓRIAS
29/04 –Mille Miglia
Luigi Villoresi/Pasquale Cassani
340 América

14/07 –GP da Grã-Bretanha
José Froilàn Gonzalez
375 F1

29/07 –GP da Alemanha
Alberto Ascari
375 F1

30/08 - Volta a França
Pagnibon/A.Barraquet
212 Expert

16/09 - GP de Itália
Alberto Ascari
375 F1

20-25/11 - II Corrida Panamérica México
Luigi Chinetti/Piero Taruffi
212 Inter

ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS DOS CARROS

Modelo 18
212 F1 - MONOLUGAR

MOTOR
Motor - longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 68 58,8 mm
Cilindrada unitária - 213,54 cm3
Cilindrada total - 2 562,51 cm3
Relação de compressão - 12:1
Potência máxima - 147 KW (200 CV) a 7 500 rpm
Potência específica - 78 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber 32 DCF
Ignição - mono, 2 magnetos
Lubrificação - cárter seco
Fricção - monodisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal,
amortecedores hidráulicos
Suspensões traseiras - independentes, mola transversal, semi-eixos oscilantes,
amortecedores hidráulicos
Travões - tambor
Caixa - 5 velocidades + marcha atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 130 l
Pneus dianteiros - 5.50 x 16
Pneus traseiros - 6.50 x 16

CARROÇARIA
Tipo - monolugar F1
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 3230 mm
Via dianteira - 1 255 mm
Via traseira - 1 200 mm
Peso - 700 kg

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima -
Acelerações - 0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo19
625 F1 - MONOLUGAR


MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 94 x 90 mm
Cilindrada unitária - 624,58 cm3
Cilindrada total - 2 498,32 cm3
Relação de compressão - 13:1
Potência máxima - 154 KW (210 CV) a 7 000 rpm
Potência específica - 84 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - arvores duplas, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 2 carburadores Weber 50 DCO
Ignição - dupla, 2 magnetos
Lubrificação - cárter seco
Fricção - multidisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal
inferior, amortecedores hidráulicos Houdaille, barra estabilizadora
Suspensões traseiras - eixo De Dion, duplo braço, mola transversal inferior,
amortecedores hidráulicos Houdaille
Travões - tambor
Caixa - 4 velocidades + marcha-atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 180 l
Pneus dianteiros - 5.25 x 16
Pneus traseiros - 7.00 x 16

CARROÇARIA
Tipo - monolugar F1
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 160 mm
Via dianteira - 1 278 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 600 kg c/ água e óleo

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 270 km/h
Acelerações - 0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo 20
500 F2 - MONOLUGAR


MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 4 cilindros em linha
Diâmetro e curso - 90 x 78 mm
Cilindrada unitária - 496,21 cm3
Cilindrada total - 1 984,85 cm3
Relação de compressão - 13:1
Potência máxima - 136 KW (185 CV) a 7 500 rpm
Potência específica - 93 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvores duplos, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 2 carburadores Weber 50 DCO
Ignição - dupla, 2 magnetos
Lubrificação - cárter seco
Fricção - multidisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola inferior
transversal, amortecedores hidráulicos
Suspensões traseiras - eixo De Dion, duplo brsço, mola transversal, amortecedores
hidráulicos
Travões - tambor
Caixa - 4 velocidades + marcha-atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 150 l
Pneus dianteiros - 5.25 x 16
Pneus traseiros - 6.50 x 16

CARROÇARIA
Tipo - monolugar F2
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 160 mm
Via dianteira - 1 270 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 560 kg

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 260 km/h
Acelerações - 0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m –

Modelo 21
212 EXPORT - SPORT/PROTÓTIPO


MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 68 x 58,8 mm
Cilindrada unitária - 213,54 cm3
Cilindrada total - 2 562,51 cm3
Relação de compressão - 8,4:1
Potência máxima - 121 KW (165 CV) a 7 000 rpm
Potência específica - 64 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber, 36 DCF
Ignição - mono, 2 distribuidores
Lubrificação - cárter húmido
Fricção - monodisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal,
amortecedores hidráulicos Houdaille
Suspensões traseiras - eixo rígido, mola semieliptíca longitudinal, amortecedores
hidráulicos Houdaille
Travões - tambor
Caixa - 5 velocidades + marcha-atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade por 120 l
Pneus dianteiros - 5.50 x 16
Pneus traseiros - 5.50 x 16

CARROÇARIA
Tipo - "berlineta", "spider", "cabriolet", 2 lugares
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 250 mm
Via dianteira - 1 278 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 850 kg berlineta)

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 220 km/h
Acelerações - 0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo 22
212 INTER - GRANDE TURISMO


MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12 CV 60º
Diâmetro e curso - 68 x 58,8 mm
Cilindrada unitária - 213,14 cm3
Cilindrada total - 2 562,51 cm3
Relação de compressão - 7,5:1
Potência máxima - 110 KW (150 CV) a 6 500 rpm
Potência específica - 58 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 velocidades por cilindro
Alimentação - 1 carburador Weber 36 DCF
Ignição - mono, 2 distribuidores
Lubrificação - cárter húmido
Fricção - monodisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal,
amortecedores hidráulicos Houdaille
Suspensões traseiras - eixo rígido, mola semielíptica longitudinal, amortecedoresd
hidráulicos Houdaille
Travões - tambor
Caixa - 5 velocidades + marcha-atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 105 l
Pneus dianteiros - 6.40 x 15
Pneus traseiros - 6.40 x 15

CARROÇARIA
Tipo - "coupé", "cabriolet", 2+2 ou 2 lugares
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 600 mm
Via dianteira - 1 278 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 1 000 kg (coupé)

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 200 km/h
Acelerações - 0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m –

Modelo 23
342 AMÉRICA - GRANDE TURISMO


MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60 º
Diâmetro e curso - 80 x 68 mm
Cilindrada unitária - 341,80 cm3
Cilindrada total - 4 101,66 cm3
Relação de compressão - 8:1
Potência máxima - 147 (200 CV) a 5 000 rpm
Potência específica - 49 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber 40 DCF
Ignição - mono, 2 distribuidores
Lubrificação - cárter húmido
Fricção - monodisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal,
amortecedores hidráulicos
Suspensões traseiras - eixo rígido, mola longitudinal, amortecedores hidráulicos
Travões - tambor
Caixa - 4 velocidades + marcha-atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 105 l
Pneus dianteiros - 6.40 x 15
Pneus traseiros - 6.40 x 15

CARROÇARIA
Tipo - "coupé", "cabriolet", 2 lugares
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 650 mm
Via dianteira - 1 325 mm
Via traseira - 1 320 mm
Peso - 1 200 kg

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 186 km/h
Acelerações - 0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

FONTE: L'Opera e il Sogno" - Livro Oficial da História da Ferrari

Contribuído por Armando de Lacerda , Quinta 8, às 22:19

O SONHO E A OBRA - 1951 - A ULTRAPASSAGEM



Mil novecentos e cinquenta e um é recordado, frequentemente, pelos historiadores como o ano em que a jovem marca bateu a "sua mãe" como Enzo Ferrari definia a Alfa Romeo, empresa onde passara vinte anos da sua vida e onde aprendeu todos os segredos do ofício.

O ano havia começado bem com as duas vitórias que Froilàn Gonzalez "O Touro dos Pampas" havia obtido durante a "Temporada Argentina" contra os Mercedes, embora estes se tratassem de modelos de antes da guerra.

Gonzalez guiava um 166 "fórmula livre" com motor de dois litros com compressor contra os três "flechas de prata" com motores de três litros, pilotados por Juan Manuel Fangio, Herman Lang e Karl Kling, batendo-os a 18 e novamente a 25 de Janeiro.

Enzo Ferrari enviou-lhe um telegrama de felicitações. Estava aberto o coração do Comendador e, automaticamente, as portas de Maranello.

Os três primeiros grandes prémios de Fórmula 1 realizaram-se na Suiça, Bélgica e França (sem contar com as 500 Milhas de Indianapolis que pontuavam para o campeonato mas não eram aceites pelos europeus) foram ganhas pela Alfa Romeo, mas com a presença constante da Ferrari na segunda posição.

No Grande Prémio da Suiça, realizado em Bremgarten a 27 de Maio, a Alfa Romeo conquistou o primeiro e terceiro lugar, respectivamente, com Juan Manuel Fangio e Giuseppe Farina, mas no meio ficou Piero Taruffi em Ferrari.

A 17 de Junho em Spa, no Grande Prémio da Bélgica, a Alfa Romeo conquistou o primeiro lugar com Giuseppe Farina, mas em segundo e terceiro lugar ficam os Ferraris de Alberto Ascari e Luigi Villoresi.

No Grande Prémio de França, realizado em Reims a 1 de Julho, a Alfa Romeo com Juan Manuel Fangio volta a ganhar, mas a Ferrari volta a alcançar o segundo lugar com Alberto Ascari/Froilàn Gonzalez, o terceiro com Luigi Villoresi e ainda o quarto com o piloto britânico Reg Parnell.

Este resultado era um sinal evidente de que a mudança estava próxima.

E, de facto a 14 de Julho, no Grande Prémio da Grã-Bretanha em Silverstone, deu-se a histórica ultrapassagem onde Gonzalez ao volante de um monolugar tipo 375 bateu o esquadrão comandado pelo seu conterrâneo Juan Manuel Fangio.

Nesta corrida verificou-se que, já nessa altura, as corridas podiam ser ganhas nas boxes, pois a Ferrari beneficiava de fazer menos paragens para reabastecimento em virtude do seu motor aspirado consumir menos que os sobrealimentados da sua rival Alfa Romeo.

A luta entre as duas equipas italianas que já se havia iniciado nos treinos, continuou durante toda a corrida com diversas mudanças no comando.

Quando Fangio entrou nas boxes, à 49ª. volta, para reabastecer, Gonzalez assumiu o comando.

Por sua vez, Gonzalez entrou para reabastecer com 61 voltas percorridas e pensou que Ascari, que havia desistido com a caixa de velocidades partida, tomasse o volante do seu carro usando da prerrogativa de primeiro piloto. Mas este indicou-lhe que continuasse e, assim, Gonzalez saiu para a pista sem perder a liderança que manteve até ao fim, apesar de Fangio ter feito tudo que sabia para o ultrapassar.

A prova terminou com a Ferrari a ocupar o primeiro e o terceiro lugar alcançado por Villoresi, tendo Fangio conquistado o segundo.

Em 1951, a televisão ainda não transmitia as corridas de Fórmula 1 e, por isso, a notícia desta vitória demorou a chegar a Maranello, por via telefónica, onde Enzo Ferrari se encontrava sozinho no escritório para saborear a alegria que uma das suas "jóias terríveis" lhe havia proporcionado. Mas, o dia seguinte proporcionou-lhe um momento inesquecível ao receber um telegrama de felicitações do presidente da Alfa Romeo a que Enzo respondeu com uma comovente carta em que, recordando os vinte anos passados na Casa Milanesa, dizia: "ainda sinto pela "nossa" Alfa a ternura que o adolescente sente pelo seu primeiro amor".


QUASE CAMPEÃO

Faltou pouco para que Alberto Ascari conquistasse, já em 1951, o título de campeão mundial.

Chegados à última prova, o Grande Prémio de Espanha, disputado em Pedralbes (Barcelona) a 28 de Outubro, Ascari encontrava-se empatado em pontos com Juan Manuel Fangio.

Um problema com os pneus e nunca esclarecido se motivado por defeito de fabrico ou por qualquer erro entre os técnicos dos pneus e os coordenadores dos carros sobre o composto a usar nesta corrida, criaram problemas que não se haviam verificado nas outras e tiraram a Ascari a possibilidade de conquistar o título.

A equipa Ferrari tinha optado por encher os depósitos a fim de poderem fazer toda a corrida sem paragens e escolheram jantes e pneus mais pequenos que os habituais.

Ascari, que comandava a prova, conseguiu aguentar a pressão de Fangio até à oitava volta, altura em que um dos pneus ficou sem rasto.

Fangio nunca mais deixou de comandar e ganhou a corrida conquistando o seu primeiro título de campeão.

Todos os Ferraris tiveram problemas de pneus não conseguindo mais que um segundo lugar alcançado por Froilàn Gonzalez.


ACTIVIDADE DESPORTIVA PLENA

De qualquer modo, mil novecentos e cinquenta e um, foi um ano rico, pleno de êxitos no campo desportivo.

Em Fórmula 1, os quatro pilotos da equipa: Alberto Ascari, Froilàn Gonzalez, Piero Taruffi e Gigi Villoresi tinham obtido uma série de resultados importantes para além da já citada vitória de Gonzalez em Inglaterra.

Alberto Ascari havia ganho o Grande Prémio da Alemanha, realizado em Nurburgring a 29de Julho, seguido de Fangio e Gonzalez e o Grande Prémio da Itália, realizado em Monza a 16 de Sertembro, seguido de Gonzalez e de Giuiseppe Farina, este último em Alfa Romeo.

Com este resultado a Ferrari conquistou a sua primeira dobradinha no campeonato mundial.

Estas duas vitórias permitiram a Ascari o número suficiente de pontos para poder discutir o título de campeão do mundo na última prova, em Barcelona. O seu monolugar tipo 375, na versão de 1951, com uma potência declarada de 370 CV a 6 600 rpm pode ter estado na origem do problema com os pneus que o impediram de lutar pela conquista do título.

Outro passo muito importante foi o das Mil Milhas onde a Ferrari, desta vez com Gigi Villoresi acompanhado do mecânico Cassani num 340 América com motor da família "Lampredi", voltou a triunfar.

É interessante referir que existiu um grande interesse da Ferrari pelas "500 Milhas de Indianapolis" enviando um técnico a assistir aquela corrida. Embora não tenha participado, foi elaborado um relato minucioso contendo todos os elementos de avaliação necessários a uma preparação tais como traçado do circuito com detalhes das inclinações da pista e das curvas, tempo de prova dos diversos concorrentes assim como o método de verificação das viaturas.

Outro resultado com ressonância mundial foi, sem dúvida, o obtido pelos dois carros tipo 212 Inter de 2 562 cm3 na Panamerica México, uma prova massacrante numa distância de mais de 3 000 quilómetros, em condições climatéricas que iam do calor tórrido a nível do mar até altitudes superiores a 3 000 metros.

As tripulações formadas por Taruffi e Chinetti e por Ascari e Villoresi classificaram-se em primeiro e segundo lugar superando os grandes carros americanos de cilindrada muito superior.

Esta vitória teve uma produtiva repercussão da marca nos EUA, mercado que Ferrari ambicionava conquistar.

Por isso, outro modelo apresentado foi um grande turismo tipo 342 América que visava uma clientela de elite. Tratava-se de uma evolução do 340 América cuja principal modificação foi a de permitir um maior espaço à cabine, permanecendo todas as principais características tais como as suspensões dianteiras independentes com mola de lâmina transversal e as traseiras com eixo rígido.

O primeiro exemplar AL, produzido em 1951, no chassis 0130 teve uma carroçaria de autoria de Ghia, numa versão 2 + 2.

O nome destes modelos já indicavam a vocação para um mercado destinado a tornar-se muito importante para o "Cavallino Rampante" e tradicionalmente habituado a cilindradas altas.

Os automóveis Ferrari da série "América" e da seguinte "Superamérica" ofereciam vantagens em relação aos automóveis comuns pois possuíam características de velocidade e de comportamento em estrada não imagináveis até então.

Do tipo 342 A "América" foram construídos outros seis exemplares
compreendidos no restrito número de chassis de 0232 a 0246, o primeiro com carroçaria de Vignale e todos os outros de Pinin Farina.


UM NOVO MOTOR

Entretanto, a tempestade estalava sobre a Fórmula 1.

O desinteresse das grandes marcas pela onerosa F1 e o facto do seu regulamento estar destinado a ser alterado em 1954 com o limite de cilindrada fixado em dois litros e meio para os motores aspirados e 750 cm3 para os sobrealimentados provocou o
abandono antecipado da F1, originando que o campeonato mundial de pilotos nas épocas de 1952 e 1953 se realizassem com carros de Fórmula 2, ou seja com motores aspirados de 2 litros.

Ferrari pensava no futuro, apesar de ter já à sua disposição o experimentadíssimo motor 166 de 12 cilindros.

Lampredi tinha outra ideia: um motor de quatro cilindros em linha, com comando duplo de válvulas à cabeça. Mesmo sabendo que teriam um curso maior e uma maior superfície de êmbolo que o correspondente V12, que chegou a ser experimentado numa versão de dois litros, Lampredi estava mais preocupado em obter um melhor binário e em economizar peso.

Nos seus cálculos, uma redução do peso do motor em 52 kg (de 181 para 129) equivaleria a um aumento da relação peso/potência de uns 15%.

Com a sua intuição, Ferrari compreendeu imediatamente que Lampredi havia tirado da manga outra carta vencedora.

Segundo a versão de Lampredi, a sua ideia concretizou-se num domingo de primavera em que, como acontecia com frequência, se encontrou na fábrica com Ferrari para trocarem impressões sobre a nova regulamentação.

Exposta a sua ideia, Ferrari pediu-lhe que, com rapidez, fizesse um esboço do projecto para que a sua concretização ficasse completamente desobstruída. E para não se perder tempo, foi ao bar, em frente da fábrica, buscar algumas "sandwiches" e uma garrafa de Lambrusco.

O técnico, que nunca abandonava o seu material de desenho, de imediato projectou o propulsor 625 para a Fórmula 1, prontamente transformado num 500 de Fórmula 2.

Com a habitual nomenclatura adoptada em Maranello, os números em questão significavam um motor de dois litros e meio para a F1 e de dois litros para a F2.

A versão maior tinha um diâmetro e curso de 94 x 90 mm e uma cilindrada unitária de 624,6 cm3 num total de 2 498 cm3 e a versão menor com um diâmetro e curso de 90 x 78 mm, uma cilindrada unitária de 496,2 cm3 e total de 1 984 cm3.

Desta forma, o motor 625 foi produzido para se estrear a 2 de Setembro no Grande Prémio de Bari numa viatura pilotada por Piero Taruffi que alcançou o terceiro lugar, atrás do vitorioso Juan Manuel Fangio que guiava o Alfetta e do outro argentino Froilàn Gonzalez ao volante de um Ferrari 375, ou seja atrás dos dois carros mais competitivos da F1.

Além das referências usuais às vitórias do ano, aos pilotos melhor sucedidos, aos colaboradores e amigos, no anuário de 1951, logo no princípio como ideia predominante, via-se o desenho em transparência do monolugar F2. Mas, Enzo Ferrari não esquecia também os seus fornecedores dedicando, a cada um deles, uma página de publicidade.


FERRARI E "PININ" FARINA

É digno de registo outro acontecimento em 1951, da maior importância para a história da empresa, que foi o encontro entre Enzo Ferrari e Battista "Pinin" Farina originário de uma extraordinária colaboração entre o construtor e o estilista de carroçarias, colaboração que perdurou mesmo após o desaparecimento dos dois.

É necessário reportarmo-nos ao ambiente industrial daquele tempo para compreender este facto.

Ferrari e "Pinin" Farina eram já famosos, cada um na sua actividade, e, em certo sentido, zelosos das suas prerrogativas. Assim, apesar dos recíprocos testemunhos de consideração e dos convites para um encontro construtivo, nenhum dos dois se decidia a dar o primeiro passo.

A solução encontrada foi a de um encontro a meio caminho entre Turim (sede de Pinin Farina) e Maranello e este acabou por realizar-se, em meados de Setembro, num pequeno restaurante em Tortona entre Enzo Ferrari, acompanhado do seu director comercial Gerolamo Gardini, e Battista Pini Farina, acompanhado de seu filho Sérgio.

Os dois compreenderam-se rapidamente e ficou decidido que Ferrari enviaria um chassis para ser trabalhado a tempo de estar presente no Salão de Genebra a realizar na primavera de 1952.

O engenheiro Sérgio Pinin Farina, filho de Battista, recorda-se que, durante a viagem de regresso, o pai o responsabilizara de garantir a continuidade de relações com o novo cliente que tinha fama de não ser fácil.

E, de facto, o trabalho realizado foi tão eficiente que esta colaboração manteve-se até aos dias de hoje o que deve ser considerada a mais duradoura no campo industrial.

NOTA: Este "post" é o resumo livre e aumentado do capítulo respeitante ao ano de 1951 da obra "L'Opera e il Sogno"

FONTES: "L'Opera e il Sogno", "Grand Prix - A história da Fórmula 1", "Bandeira da Vitória - A história do Automobilismo" e "Ferrari - 60 ans de scuderia"

Contribuído por Armando de Lacerda , Domingo, 14 de Dezembro de 2008 às 18:56


sexta-feira, 21 de agosto de 2009

O SONHO E A OBRA -1950 - Nomes, números e especificações técnicas



A EMPRESA
Tipo de empresa - Firma em nome individual
Titular - Enzo Ferrari
Director técnico - Gioachino Colombo
Director desportivo - Federico Giberti
Automóveis construídos - 26
Empregados - 255


PILOTOS COM PARTICIPAÇÃO OFICIAL
Alberto Ascari
Giovanni Bracco
Dorino Serafini
Raymond Sommer
Mário Tadini
Piero Taruffi
Roberto Vallone
Luigi Villoresi

GRANDES VITÓRIAS23/04 – Mille Miglia
Giannino Marzotti/Marco Crosara
195 S

23/07 – 12 Horas de Paris
Luigi Chinetti/Jean Lucas
166 MM

20/08 – GP da Alemanha
Alberto Ascari
166 F2


ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS DOS CARROS

Modelo 11
275 F1 - MONOLUGAR


MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 72 x 68 mm
Cilindrada unitária - 276,86 cm3
Cilindrada total - 3 322,34 cm3
Relação de compressão - 10:1
Potência máxima - 221 KW (300 CV) a 7 300 rpm
Potência específica - 90 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber 42 DCF
Ignição - única, 2 magnetos
Lubrificação - cárter seco
Fricção - multidisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal
inferior, amortecedores hidráulicos Houdaille
Suspensões traseiras - eixo De Dion, duplo braço, mola transversal inferior,
amortecedores hidráulicos Houdaille
Travões - tambor
Caixa - 4 velocidades + marcha atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 195 l
Pneus dianteiros - 5.50 x 16
Pneus traseiros - 7.00 x 16

CARROÇARIA
Tipo - monolugar F1
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 320 mm
Via dianteira - 1 278 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 850 kg c/água e óleo

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 280 km/h
Acelerações -0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo 12
340 F1 - MONOLUGAR


MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 80 X 68 mm
Cilindrada unitária - 341,80 cm3
Cilindrada total - 4 101,66 cm3
Relação de compressão - 12:1
Potência máxima - 246 KW (335 CV) a 7 000 rpm
Potência específica - 82 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber 42 DCF
Ignição - única, 2 magnetos
Lubrificação - cárter seco
Fricção - multidisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadrilátero transversal, mola transversal
inferior, amortecedores hidráulicos Houdaille.
Suspensões traseiras - eixo De Dion, duplo braço, mola transversal inferior,
amortecedores hidráulicos Houdaille.
Travões - tambor
Caixa - 4 velocidades + marcha atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 195 l
Pneus dianteiros - 5.50 x 16
Pneus traseiros - 7.00 x 16

CARROÇARIA
Tipo - monolugar F1
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 320 mm
Via dianteira - 1 278 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 850 kg c/água e óleo

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 300 km/h
Acelerações -0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo 13
375 F1 - MONOLUGAR
MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 80 X 74,5 mm
Cilindrada unitária - 374,47 cm3
Cilindrada total - 4 493,73 cm3
Relação de compressão - 11:1
Potência máxima - 257 KW (350 CV) a 7 000 rpm
Potência específica - 78 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber 42 DCF
Ignição - única, 2 magnetos Marelli
Lubrificação - cárter seco
Fricção - multidisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal
inferior, amortecedores hidráulicos Houdaille.
Suspensões traseiras - eixo De Dion, duplo braço, mola transversal inferior,
amortecedores hidráulicos Houdaille
Travões - tambor
Caixa - 4 velocidades + marcha atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 195 l
Pneus dianteiros - 5.50 x 16
Pneus traseiros - 7.50 x 17

CARROÇARIA
Tipo - monolugar F1
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 320 mm
Via dianteira - 1 278 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso -

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 320 km/h
Acelerações -0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo 14
195 S - SPORT/PROTÓTIPO
MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 65 x 58,8 mm
Cilindrada unitária - 195,08 cm3
Cilindrada total - 2 341,02 cm3
Relação de compressão - 8,5:1
Potência máxima - 125 KW (170 CV) a 7 000 rpm
Potência específica - 73 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber 36 DCF
Ignição - única, 2 distribuidores
Lubrificação - cárter húmido
Fricção - multidisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal,
amortecedores hidraulicos
Suspensões traseiras - eixo rígido, mola semielíptica longitudinal, amortecedores
hidráulicos, barra estabilizadora
Travões - tambor
Caixa - 5 velocidades + marcha atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível -
Pneus dianteiros - 5.50 x 15
Pneus traseiros - 6.00 x 15

CARROÇARIA
Tipo - "spider", "berlineta", 2 lugares
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 250 mm
Via dianteira - 1 278 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 730 kg (spider)

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima -
Acelerações -0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo 15
275 S - SPORT/PROTÓTIPO


MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 72 x 68 mm
Cilindrada unitária - 276,86 cm3
Cilindrada total - 3 322,34 cm3
Relação de compressão - 8:1
Potência máxima - 199 KW (270 CV) a 7 200 rpm
Potência específica - 81 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber 40 DCF
Ignição - únicas, 2 distribuidores
Lubrificação - cárter húmido
Fricção - multidisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal,
amortecedores hidraulicos
Suspensões traseiras - eixo rígido, mola longitudinal, amortecedores hidráulicos,
barra estabilizadora
Travões - tambor
Caixa - 5 velocidades + marcha atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível -
Pneus dianteiros - 5.50 x 16
Pneus traseiros - 5.50 x 16

CARROÇARIA
Tipo - "spider" 2 lugares
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 420 mm
Via dianteira - 1 270 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 850 kg

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 240 km/h
Acelerações -0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo 16
340 AMÉRICA - SPORT/PROTÓTIPO
MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60 º
Diâmetro e curso - 80 x 68 mm
Cilindrada unitária - 341,80 cm3
Cilindrada total - 4 101,66 cm3
Relação de compressão - 8:1
Potência máxima - 162 KW (220 CV) a 6 000 rpm
Potência específica - 54 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 3 carburadores Weber 40 DCF
Ignição - únicas, 2 distribuidores
Lubrificação - cárter húmido
Fricção - monodisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal,
amortecedores hidráulicos Houdaille
Suspensões traseiras - eixo rígido, mola semielíptica longitudinal, amortecedores
hidráulicos Houdaille
Travões - tambor
Caixa - 5 velocidades + marcha atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 135 l
Pneus dianteiros - 6.40 x 15
Pneus traseiros - 6.40 x 15

CARROÇARIA
Tipo - "spider", "berlineta", "coupé", 2+2 ou 2 lugares
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 420 mm
Via dianteira - 1 278 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 900 kg (berlineta)

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 240 km/h
Acelerações -0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -

Modelo 17
195 INTER - GRANDE TURISMO

MOTOR
Motor - dianteiro, longitudinal, 12V 60º
Diâmetro e curso - 65 x 58,8 mm
Cilindrada unitária - 195,08 cm3
Cilindrada total - 2 341,02 cm3
Relação de compressão - 7,5:1
Potência máxima - 96 KW (130 CV) a 6 000 rpm
Potência específica - 56 CV/l
Binário máximo -
Distribuição - árvore de cames, 2 válvulas por cilindro
Alimentação - 1 carburador Weber 36 DCF
Ignição - única, 2 distribuidores
Lubrificação - cárter húmido
Fricção - monodisco

CHASSIS
Quadro - tubular em aço
Suspensões dianteiras - independentes, quadriláteros transversais, mola transversal,
amortecedores hidráulicos Houdaille
Suspensões traseiras - eixo rígido, mola semielíptica longitudinal, triângulo de
reacção, amortecedores hidráulicos Houdaille
Travões - tambor
Caixa - 5 velocidades + marcha atrás
Direcção - sem-fim e sector
Depósito de combustível - capacidade para 82 l
Pneus dianteiros - 5.90 x 15
Pneus traseiros - 5.90 x 15

CARROÇARIA
Tipo - "coupé" 2 lugares
Comprimento -
Largura -
Altura -
Distância entre eixos - 2 500 mm
Via dianteira - 1 270 mm
Via traseira - 1 250 mm
Peso - 950 kg

PRESTAÇÕES
Velocidade máxima - 180 km/h
Acelerações -0 - 100 km/h -
0 - 400 m -
0 - 1 000 m -
FONTE: L'Opera e il Sogno" - Livro Oficial da História da Ferrari

Contribuído por Armando de Lacerda , Quarta 7, às 21:22


segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A CRISE NINJA



Acabei de ler um livro interessantíssimo pela forma como está escrito: “A Crise Ninja”.

Num estilo simples e optimista, que torna a leitura atraente, Leopoldo Abadía, explica-nos os mistérios da economia actual e como se chegou a actual crise para a qual a maioria de nós não contribuiu mas que a todos está a afectar.

Ninja que vem de “No Income, No Job, no Assets, ou seja pessoas sem rendimentos, sem empregos fixos e sem propriedades a quem foram feito créditos para compra de casa, “brilhante ideia” que permitia conceder empréstimos com maior taxa de risco o que permitia cobrar juros mais altos.

E este tipo de créditos à habitação, chamados empréstimos “subprime”, conduziu-nos à actual situação da qual não sabemos como vamos sair.

Leopoldo Abadía, com 76 anos de idade, é doutorado em engenharia industrial, ITP Harvard Business School, e durante trinta e um anos foi professor no IESE, Instituto de Estudos Superiores da Empresa.

Com doze filhos e trinta e oito netos, diz que não percebe nada de economia mas, em Janeiro de 2008, escreveu um relatório intitulado “A Crise Ninja” que se transformou numa claríssima explicação dos motivos que originaram a grande crise que o mundo vive.

O seu blogue www.leopoldoabadia.com já teve mais de três milhões de visitantes, fez trezentas e cinquenta conferências num ano, tem mais de um milhão de referências no Google, duzentos mil participantes nas suas conferências, cento e cinquenta mil exemplares vendidos em Espanha, um milhão e oitocentos mil visitas ao seu vídeo no You Tube, nove mil e quinhentos amigos no Facebook e seiscentos artigos publicados na imprensa.

Estes números atestam bem o interesse que esta obra e o seu autor despertaram.

Comecei a lê-la e só parei quando a terminei, tal a atracção que me despertou. Por isso a aconselho a todos visto tratar-se de uma verdadeira lição de economia sem as habituais e difíceis explicações dos economistas que parece pretenderem que não se compreenda nada daquilo que dizem para que a matéria fique apenas no seio dos iluminados.

Leopoldo Abadía mostrou que é possível tratar estes problemas numa linguagem simples e atractiva que a todos prenda.

domingo, 16 de agosto de 2009

PIAF



Na passada sexta-feira fui a Lisboa, ao Politeama, ver “Piaf”, numa encenação de Filipe La Féria, a partir da dramaturgia original do musical da autora inglesa Pam Gems, baseada na vida de uma das maiores interpretes da canção francesa: Edith Piaf.

Num palco, quase despido de cenários e em que prevalece a interpretação dos actores, faz-se o retrato dos episódios de maior relevo daquela extraordinária artista, desde os tempos da prostituição, passando pelos seus amores e desilusões e pelos seus sucessos nas mais importantes salas do mudo, até se tornar numa das maiores divas da canção francesa, o que levou Marlene Dietrich a afirmar um dia: “Se tiverem de dar um novo nome a Paris, deverá ser chamada Piaf".

O papel principal, de grande desgaste, é interpretado, alternadamente, por Wanda Stuart e Sónia Lisboa.

Na noite a que assistimos ao espectáculo a representação cabia a Sónia Lisboa que já conhecíamos da final do concurso “Chuva de Estrelas” como uma excelente interprete das canções de Piaf.

Gostámos da sua interpretação, assim como apreciámos o excelente desempenho de Noémia Costa numa personagem um pouco diferente das que costuma representar e não queremos deixar de mencionar Paula Sá na interpretação de Marlene Dietrich.

O espectáculo, valorizado pelas inesquecíveis canções de Edith Piaf, foi frequentemente aplaudido por uma sala completamente cheia, facto habitual que considero a faceta mais importante da carreira de Filipe La Féria.

Ele conseguiu, com os seus espectáculos, reconciliar o público com o teatro que, cheio de entusiasmo, os aplaude freneticamente.

Apesar das críticas dos seus detractores que esquecem todo o outro teatro que ele também já fez com êxito, Filipe La Féria conseguiu o regresso do grande público que tão arredado andava.

A esses críticos lembro o que o meu Amigo e grande Homem do teatro, Rogério Paulo, dizia ao referir-se à Companhia Rafael de Oliveira, companhia com que tive o grande prazer de privar e que prestou um relevante serviço ao teatro português levando-o a localidades que, sem a sua actuação, nunca teriam sabido o que era teatro.

Rogério Paulo dizia: “Se eu vou a Azeitão e tenho salas vazias e Rafael de Oliveira as enche, ele é que está certo e eu errado”.

Que meditem nisto os “iluminados” que não conseguem encher uma sala e só afastam o público ao servir-lhe espectáculos que nada lhe dizem.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

MORTE NO PALCO



Ana Margarida Pereira era uma jovem de 26 anos que trabalhava na Universidade de Évora onde se licenciara em Estudos Teatrais e se encontrava a fazer o mestrado em Teatro – Dramaturgia e Encenação.

Frequentou vários “workshops” orientados por Paulo Eduardo Carvalho, Yuri Pogrebnichko, Agnés Limbo, Steve Johnston e Miguel Seabra.

Iniciara-se no teatro em 1998 com o grupo de teatro amador “Figuras do Espanto” e tendo, desde então, colaborado como actriz e assistente de encenação em companhias como “A Bruxa Teatro Associação”, “Teatro Tosco – Laboratório do Cómico” (do qual era membro fundador), “Teatro Municipal de Almada” e “Escola de Mulheres”, tendo sido dirigida por nomes como Fernanda Lapa, Luís Varela e Verónica Fabrini, entre outros.

Há pouco, teve a satisfação de ver o prémio do seu entusiasmo ao ser chamada ao Teatro Nacional D. Maria II onde fazia parte do elenco da peça “Agosto em Osage”, que tive o prazer de ver.

Há cerca de duas semanas, quando se encontrava em cena, teve uma paragem cardíaca, não mais saindo de coma e acabando por falecer na madrugada do passado dia 2.

A peça, interrompida naquela noite fatídica, não voltou a ser posta em cena.

É comovente ver morrer alguém em plena juventude e quando realizava aquilo que tanto amava e que fora o sonho da sua vida.

Fonte: Os dados biográficos foram retirados do programa de “Agosto em Osage” do Teatro Nacional D.Maria II

domingo, 9 de agosto de 2009

MORREU RAUL SOLNADO



“Nós, os do teatro, somos vendedores de sonhos.
O público compra um bilhete e não leva nada para casa.
Se entra numa loja e compra uma gravata, leva a gravata.
Aqui leva sonhos.”
Raul Solnado

Morreu um grande comediante!


Morreu um Homem Bom!

Com o falecimento de Raul Solnado, está de luto o teatro português. Está mais pobre Portugal.

Ao longo de uma vida a fazer-nos rir, fez-nos pensar, tentou que fossemos melhores, que o ajudássemos a transformar um mundo onde reinasse a paz, a poesia e o amor pelo próximo.

Como eu gostaria de ter talento para poder transmitir tudo aquilo porque este grande Homem pugnou, tudo o que ele sentia e como me reconheço impotente para o fazer.

Tentarei fazer um breve resumo da sua vida e de tudo que nos legou.

Solnado contava que. com quatro anos, um pombo amestrado pousou-lhe no ombro e, como se encontrava de tronco nu, cravou-lhe as unhas tentando segurar-se. Como isso lhe fizesse doer deu um grito “foda-xe”.Os amigos do pai, que se encontravam presentes, deram uma gargalhada mas aquele pô-lo de castigo no quarto.

“Era a minha primeira perplexidade. Tenho êxito, faço rir e sou castigado e vou preso. Que mundo é este onde cheguei”.

Assim, relata ele a primeira gargalhada das muitas que iria provocar ao longo da vida.

Como, na altura, as crianças ainda podiam ir ao teatro, corria com o pai todos os teatros de Lisboa o que o levava a dizer: “Quando for grande quero ser compère”.

Quando se empregou, com o que ganhava corria as gerais dos teatros chegando a ver a mesma peça três e quatro vezes.

Trabalhava de dia na Vassouraria da Esperança e estudava à noite na Escola Comercial Rodrigues Sampaio onde tinha, como companheiro de carteira, Varela Silva.

Numa festa de alunos, fazem os dois “Todo o Mundo e Ninguém” de Gil Vicente.

Na década de quarenta desencadeou-se um movimento, com origem nos artigos publicados por António Pedro no Diário de Lisboa, contra o pobre teatro que se encenava nalguns palcos portugueses, imitado pelos grupos de amadores, que originou o nascimento de uma série de agrupamentos a quem o teatro muito ficou a dever, movimento a que me referirei em detalhe num próximo artigo.

Entre estes, encontrava-se a Sociedade de Instrução e Recreio Guilherme Cossoul, verdadeiro alfobre de actores pois por ali passaram Jacinto Ramos, José Viana, Varela Silva, João Sarabando e outros.

Raul Solnado começou a frequentar aquela colectividade e faz “O Pedido de Casamento” de Tchekov, numa encenação de José Viana. Em 1951, inscreve-se no curso nocturno de “Arte de Dizer e Arte de Representar” mas, apesar de ter pago as propinas do ano todo, apenas frequenta uma aula. Dizia que ao Conservatório não devia nada, mas à Guilherme Cossoul devia os primeiros passos.

Depois de fazer a tropa, estreia-se, a 10 de Dezembro de 1952 no Maxime, como profissional a ganhar cinquenta escudos por noite.

Em 1953, Vasco Morgado assiste ao “show” e convida-o para entrar na primeira revista do Teatro Monumental, “Canta Lisboa”, com Laura Alves.

Ribeirinho, o encenador da revista, pergunta-lhe se não tem outro nome, considerando que Raul Almeida seria mais fácil de decorar. Mas, Raul, ao fim de uma semana, diz: “É Solnado. Se ninguém decorar paciência. É Solnado!”.

Na noite da estreia, a 14 de Fevereiro de 1953, como ninguém o conhecia e perguntavam quem era, dizia-se: “É o Solnado … desconhecido”. Dizia que o nome dele no cartaz vinha lá em baixo, ao lado do nome da tipografia.

Ali começou a sua aprendizagem com Laura Alves, Irene Isidro e Manuel Santos Carvalho e recebe a protecção inesperada de António Silva que lhe dava “deixas” diferentes para o obrigar a improvisar.

Quando Vasco Morgado monta a comédia “Ela não gostava do patrão” disse: “Ponham lá o puto que respondia ao António Silva”.

Trabalhou com Palmira Bastos, Irene Silva, Hermínia Silva, Vasco Santana, Assis Pacheco e Alves da Cunha. Destes Mestres recebeu influência e descobriu o orgulho profissional e a disciplina.

Ficava nos bastidores a assistir pois queria aprender a ser actor e dizia: “O meu Conservatório foram os bastidores dos teatros”.

Varela Silva, regressado de Paris, oferece-lhe um presente “Je Suis un Homme de Théatre” de Jean-Louis Barrault e ele, radiante, foi mostrá-lo a Teresa Gomes que lhe disse: “Ó filho não leias isso. Essas coisas não ensinam nada! Em cima das tábuas é que eles se querem ver!”.

Solnado dizia: “Havia em Portugal um grupo de actores que fariam inveja a qualquer país. Sentia-me honrado por trabalhar com eles”.

Em Dezembro de 1953 assina com Vasco Morgado um contrato de dois mil e quinhentos escudos por mês, mas chegada a época de verão e porque as receitas de bilheteira eram fracas, o Vasco propõe-lhe ficar a ganhar dois mil escudos quando houvesse espectáculos e mil escudos na altura dos ensaios. Como lhe surgira um contrato para o Apolo por três mil e seiscentos escudos, propõe ficar com o Vasco desde que este lhe pagasse tanto na altura dos espectáculos como dos ensaios, ou seja dois mil escudos. Este não aceita e vai-se embora dizendo que só regressará a ganhar seis mil escudos.

Vai para o Apolo onde trabalha ao lado de Milu, Curado Ribeiro e Santos Carvalho. Em 1954 trabalha com o grande Mestre Alves da Cunha que, até morrer, fica seu amigo.

Quando regressa à companhia de Vasco Morgado é, de facto, com seis mil escudos mensais e um camarim de duas assoalhadas.

Faz, então, “Não faças Ondas” com um elenco excepcional: Villaret, Milu, Costinha, Leónia Mendes e Carlos Coelh. Solnado tinha três excelentes rábulas: “Ali-Baba”, “Alfacinha de Gema” e “O Canalizador”, um dos vídeos com que ilustramos este artigo.

Em 1957 estreia-se na RTP e, entre 1956 e 1987, interpreta vários filmes entre os quais “Perdeu-se um marido”, “Sangue Toureiro”, “O Tarzan do 5º.esquerdo”, “As Pupilas do Senhor Reitor”, “Requiem”, “Senhor Jerónimo”, “O Bobo” e “Balada da Praia dos Cães”. Mas, de todos destaca-se “Dom Roberto”, momento histórico do cinema português, realizado por José Ernesto de Sousa, nos anos 60, que era como que um desafio contra o regime político no poder e que teve Raul Solnado como protagonista.

A 15 de Agosto de 1958 estreia-se no Brasil com “Agora é que são elas”, autêntico fracasso e ao fim de seis meses com os salários em atraso, recebe uma proposta de contrato a assinar com a TV Tupi.

Mas um almoço com amigos portugueses, para fazerem frente ao bacalhau, azeite e vinho que o pai lhe havia enviado, em que se falou e chorou com saudades de Portugal, alterou-lhe o rumo e, findo o repasto, em vez de ir assinar o contrato foi tratar de passagem para Lisboa.

Viajou na 3ª.classe do Vera Cruz, mas considerou a viagem mais luxuosa que fez visto que, dados os poucos passageiros, o comandante transferiu-o para a primeira classe.

Vasco Morgado queria-o de volta à sua companhia, mas esqueceu-se do encontro que havia marcado para assinatura do contrato e Raul vai para o ABC.

Da revista envereda para a comédia com “A Tia de Charley”, um travesti já interpretado por João Villaret, Augusto Figueiredo e Costinha. Solnado teve o mérito de nunca se assemelhar aos actores que o antecederam.

Representava “A Tia de Charley” quando António de Cabo (com quem tive o prazer de conviver em Luanda) lhe trouxe o disco de Miguel Gila “História da Guerra”.

Entusiasmadíssimo com o texto, aproveita uma digressão ao Funchal com Humberto Madeira para, muito a medo, contar a história para ver a reacção do público, ficando admirado com a explosão de gargalhadas que provocou.

Receoso ainda com o resultado, volta a fazer a experiência numa festa realizada no ringue de patinagem de Oeiras e obtém idêntico resultado.

Resolve então dize-lo num ensaio da revista que iria fazer, mas porque havia bastante azáfama com a montagem do espectáculo a sua intervenção não mereceu qualquer atenção o que levou o ensaiador Rosa Mateus a não querer a inclusão daquele número o que leva Solnado a dizer que ou contava a história ou não entrava na revista.

Nelson de Barros corta relações com ele porque queria que ele fizesse um terceto e não aquele número.

No ensaio para a censura leu o texto apressadamente e o mesmo passou, apenas com a intervenção muito simpática de um dos censores que lhe disse que tinha que cortar uma coisa: “Você fala na guerra de 14 e isso não pode ser”. Raul perguntou se podia ser de 1908 e ele disse que isso à vontade.

Foi o ponto alto da revista e um dos mais altos da sua carreira.

Depois de uma digressão a Angola, influenciado pelos teatros de bolso que vira no Brasil, começa a pensar na construção de um o que o leva a uma longa batalha de 1963, ano da concepção, até estreia em 1965.

Entretanto, em 1964, volta ao Brasil levando Baptista Bastos como secretário e, desta vez, obtém um grande êxito.

Baptista Bastos tinha sido despedido do Século por ter estado envolvido da Revolta da Sé e trabalhava na República com o vencimento de dois mil escudos. Solnado ofereceu-lhe um vencimento de seis mil escudos e levou-o com ele.

O Teatro Villaret é inaugurado a 10 de Janeiro de 1965 num espectáculo memorável com a peça “O Inspector Geral” de Gogol. Na abertura, Luis Francisco Rebelo diz que aquela inauguração é a homenagem de uma geração teatral ao grande João Villaret no ano em que se comemorava o quinto centenário de Gil Vicente.

O novo teatro, único construído por um actor, apresenta um excelente número de peças, mas representa para o Raúl uma luta titânica pois iniciara a obra com cinquenta contos e for obrigado a assinar um número enorme de letras. Representava a pensar se, no dia seguinte, havia dinheiro para a letra.

Para fazer face aos encargos, em dois anos fez 1 220 espectáculos e só teve dois dias de descanso: o dia de Natal e Sexta-feira Santa.

Numa conversa com Fialho Gouveia (outro meu Amigo já desaparecido), surge a ideia de criar o Zip-Zip, ideia a que se junta também Carlos Cruz.

Este programa surge a 26 de Maio de 1969 e durante sete meses provoca profundas alterações de espírito e de comportamento.

O Zip-Zip, que nascera sem nome, sem definições e sem contornos concretos, torna-se num programa de televisão atento aos indícios de transformação do mundo.

O 25 de Abril encontra-o na Roménia pois conseguira uma autorização especial da polícia e limitada aquele país para satisfazer o seu desejo de visitar um país do leste. Quando telefonou para Lisboa e lhe disseram que houvera uma revolução, pensou que estavam a brincar.

Mas, em finais de 1975, desiludido, faz a denúncia dos excessos cometidos naquele ambiente escaldante: “O 25 de Abril foi para mim uma vertigem deslumbrante que logo se transformou num espectáculo degradante pelo qual os Portugueses pagam um bilhete caríssimo. Temos assistido a uma onda crescente de ódio, à intolerância, às vinganças pessoais e ao triunfo da incompetência.

Estamos exaustos de viver nesta paranóia colectiva. Temos de nos agarrar à esperança de que o bom senso acabará por prevalecer, o que é inevitável. A festa dos cravos foi muito bonita, mas está aí a conta da florista”.

Em Dezembro de 1975 alcança outro grande êxito, no Teatro Maria Matos, ao interpretar “Schweik na Segunda Guerra Mundial”.

Em Dezembro de 1978 aparece, durante dezasseis horas, na RTP, a realizar a “Operação Pirâmide” que rendeu mais de cem mil contos a favor da Cruz Vermelha Portuguesa. À imprensa disse: “Será um momento de reflexão que poderá funcionar como um pára-choques para nós, nós que temos andado todos muito zangados uns com os outros. Somos um país zangado, temos de fazer as pazes”.

Com Armando Cortês, entregou-se à ideia da construção da Casa do Artista, sociedade de apoio aos artistas, de que foi director até morrer.

Ao longo da vida, Raul Solnado, imaginou projectos, lutou por objectivos e empolgou-se com ideias, deixando-nos a mensagem: Façam o favor de serem felizes.

Leitão de Barros, num autógrafo, escreveu: “Para o Raul Solnado que nasceu na Esperança e chegou à certeza de ser o maior actor do seu tempo”.

Fonte: “Raul Solnado – A vida não se perdeu” de Leonor Xavier





sexta-feira, 7 de agosto de 2009

O SONHO E A OBRA - 1950 - NASCE A FÓRMULA 1



A época desportiva de 1950 começou, na realidade, em fins de 1949 com a primeira corrida da já clássica "Temporada Argentina" onde a Ferrari compareceu em força, obtendo quatro vitórias nas quatro corridas em que participou.

Nas provas para monolugares de "Fórmula Livre" apresentou três 166 FL com compressor tripulados por Alberto Ascari, Luigi Villoresi e Danino Sarafini que se defrontaram com dois monolugares da Equipa Argentina para Juan Manuel Fangio e Benedito Campos, um 1 500 cm3 mono compressor de Peter Whitehead, a aguerrida concorrente Maserati com três carros com motores sobrealimentados de 1 720 cm3 entregues a Nino Farina, Príncipe Bira e Piero Taruffi, assim como três 1 500 cm3 para Froilan Gonzalez, Reginal Parnell e Emanuel de Graffenried e ainda o Maserati-Milão de Felice Bonetto.

Presentes também dois velhos Talbot Lago de 4 500 cm3 sem compressor dos franceses Philippe Etancelin e Louis Rosier.

Alberto Ascari vence, a 18 de Dezembro, o Grande Prémio General Peron e Gigi Villoresi vence o Grande Prémio Evita Peron. Ascari volta a impor-se ao ganhar a corrida de Mar del Plata, uma localidade balnear situada 400 quilómetros a sul de Buenos Aires e Villoresi conquista, por último, o Grande Prémio de Rosário.

Na corrida para carros de sport que fazia parte do programa de Mar del Plata impôs-se o ídolo local Carlos Menditeguy, um piloto amador que, apesar da insuficiência de treinos, obtinha sempre bons resultados quando corria.

O sucesso com os Ferraris continuou no Grande Prémio de Marsiglia, em Fórmula 2, ganhas por Villoresi seguido de Ascari, Fangio e Sommer.

Os carros de sport levam para Maranello bastantes vitórias obtidas em corridas quer em Itália quer no estrangeiro, mas a atenção não se concentrava apenas nesses carros.Em 1950 iniciava-se, na Fórmula 1 e o confronto directo com as rivais italianas Alfa Romeo e Maserati, de longe, as mais fortes de quantas outras da Europa daquele tempo. E, claro, o verdadeiro objectivo da Casa de Maranello era bater estas duas marcas.

AS "MILLE MIGLIA"
Os dois primeiros motores projectados por Lampredi, com a sigla 275 e uma cilindrada total de 3 300 cm3, foram montados em dois carros para disputarem as Mil Milhas, entregues a Ascari e Villoresi, respectivamente com os mecânicos Nicolini e Pascual Cassani, mas não chegaram ao fim devido a problemas de caixa.

Contudo, a vitória chegava à Ferrari através da proeza do jovem Conde Giannino Marzotto que conseguiu um feito histórico numa corrida que ficou conhecida como "la corsa in doppiopetto" por o herdeiro da família de um industrial de têxteis de Veneza ter conduzido toda a prova vestindo um elegante terno azul, feito na sua empresa familiar, apesar da chuva torrencial que caía sobre a sua "berlineta spider".

Marzotto, acompanhado do seu amigo Marco Crosara, conduziu impecavelmente, sempre colado aos dois pilotos oficiais da marca, seguindo em primeiro quando estes desistiram.

Os três irmãos de Marzotto também participaram conduzindo Ferraris: Vittorio Emanuele classificou-se em nono e Umberto e Paolo desistiram devido a acidente.

A surpreendente vitória de Giannino Marzotto num 195 S com motor de 2 341 cm3 foi excelente para a jovem fábrica pois tinha sido obtida por um piloto não profissional, embora muito bom e, desta forma, serviu de publicidade ao novo modelo destinado a clientela não estritamente desportiva.Feitos destes eram extraordinariamente úteis para a Casa de Maranello pois permitia alargar o seu mercado.

FÓRMULA 1
O momento da verdade aproximava-se pois a CSI - Comission Sportive International da FIA havia aceite a proposta do delegado italiano António Brivio-Sforza para ser criado o Campeonato do Mundo de Pilotos de Fórmula 1 a ter início em 1950.

A 10 de Abril, no Grande Prémio de Pau, em França, a Ferrari apresentou três carros, ainda do velho tipo, para Villoresi, Ascari e Raymond Sommer contra três Maseratis, quatro Talbots e três Simca-Gordinis.

Fangio pilotava um Maserati da equipa argentina e ganhou com 30 segundos de vantagem sobre Villoresi.Fangio era já piloto da Alfa Romeo quando, a 16 de Abril, correu com um Alfetta 158 em San Remo, embora sem ser em representação da marca.

Tratou-se de uma manobra astuta pois se as coisas corressem mal podia-se sempre atribuir à pouca adaptação do piloto ao carro, mas se, pelo contrário, o resultado fosse bom o mérito era todo do carro.Mostrando todo o estofo de que era feito, o argentino enfrentou sete Ferraris, entre os quais dois 125 GPC tipo 48 com Ascari e Villoresi e oito Maseratis, acabando por vencer Villoresi por uma escassa diferença.

A mensagem era bem clara: a Alfa estava pronta para enfrentar as outras equipas.

A primeira competição para o campeonato do mundo de pilotos era o Grande Prémio da Grã-Bretanha, a 13 de Maio em Silverstone (naquela altura na Grã-Bretanha corria-se ao sábado).

Enzo Ferrari decidiu não participar e, embora as razões da renúncia não fossem claras, pode-se presumir que agia com sábia avaliação das despesas e das respectivas contrapartidas. A Ferrari era ainda uma pequena empresa artesanal, que tinha de se manter pelos seus próprios meios, em comparação com grandes complexos industriais como a Alfa Romeo e a Maserati.A deslocação a Inglaterra era longa, onerosa e de resultados incertos. Por isso, foi escolhida uma manifestação muito mais aconselhável no ponto de vista de resultados:o Grande Prémio de Mons para fórmula 2, uma prova dividida em duas mangas e uma final. Ascari e Villoresi ganharam tudo seguidos de Sommer.

Finalmente, chegou o primeiro grande encontro directo com a Alfa Romeo no Grande Prémio de Mónaco, no circuito citadino de Monte Carlo, um acontecimento clássico destinado a impor-se até aos dias de hoje.

Os três Ferraris de Ascari, Villoresi e Sommer não chegaram a tempo das sessões de qualificação e alinharam na terceira linha da grelha para disputarem a prova com três Alfas, cinco Maseratis, três Talbots e um ERA.

A prova, disputada pelas não muito largas ruas da cidade, era propícia a que o mínimo problema provocasse grandes riscos que foi o que sucedeu, logo no fim da primeira volta, quando Farina colidiu com Gonzalez originando uma grande confusão de carros.Fangio habilmente e com sorte conseguiu passar e colocar-se na primeira posição que manteve até final. Ascari ficou em segundo e Sommer em quarto, atrás de Chiron, mas era evidente que, sem o acidente, os Alfas teriam conquistado os três primeiros lugares.

Entretanto, em Maranello, Enzo estudava o que fazer e decidiu continuar a enviar para as corridas carros com motores sobrealimentados enquanto, em segredo, continuava o desenvolvimento do motor aspirado.

Na competição seguinte, o Grande Prémio da Suiça, realizada a 4 de Junho, os três Ferraris foram obrigados a desistir. O de Ascari por avaria no motor e os de Villoresi e Sommer por quebra dos semi-eixos pelo que foi insuficiente a satisfação ao saberem que também o Alfa Romeo de Fangio tinha sido forçado a abandonar.

Para o Grande Prémio da Bélgica, realizado duas semanas depois, hesitou-se entre mandar o novo carro ou um seu clone, tendo-se optado por esta última hipótese. Assim, montou-se um motor tipo 275 com carburadores aumentados e cárter seco num chassis tipo GP 49 com uma nova caixa e diferencial.

Ascari conseguiu ficar em quinto atrás dos três Alfas de Fangio, Fagioli e Farina e de um surpreendente Rosier com um velho Talbot. Villoresi com o 125 com compressor não conseguiu mais que um sexto lugar.

Mas a grande novidade era que os carros com compressor consumiam cerca de 9,5 litros por volta, ao longo dos 14 quilómetros do circuito de Spa-Francorchamps, enquanto o 275 gastava apenas 4,8 litros. Isto abria novas perspectivas de estratégia e pressagiava o fim dos motores sobrealimentados.

Com a habitual técnica do aumento progressivo da cilindrada do Tipo 275 fazia-se, ao mesmo tempo, o acompanhamento do Tipo 340 de 4 100 cm3 testado no Grande Prémio de Genebra, competição não pontuável para o campeonato do mundo. A versão final do Tipo 375 de 4 500cm3 estava pronta para a sua estreia no Grande Prémio de Itália, a 3 de Setembro.

Em Monza, na pista da casa, o esquadrão de cinco Alfas eram como o Golias contra o pequeno David - Ferrari que participava com Alberto Ascari e Dorini Serafini.Ascari mantém uma animada luta com Farina até o seu motor morrer. Toma, então, o carro de Dorini e termina em segundo lugar atrás do pequeno Alfetta 158 de Nino Farina que venceu assegurando, assim, o primeiro título mundial de condutores na história da moderna Fórmula 1.

Mas o segundo lugar de Ascari abala o estado de espírito da Alfa pois, a partir daquele momento, a Ferrari passava a ser uma referência da Fórmula 1 tornando-se a grande protagonista no mundo dos grandes prémios.

A PRODUÇÃO
Para além do considerável esforço feito para desenvolver o monolugar de fórmula 1, em 1950 foram concluídos dois modelos com a evolução do motor projectado por Colombo com o respectivo aumento de cilindrada do modelo 195.

Assim, o motor de 2 341 cm3 foi oferecido em duas versões: a S com 170 cavalos destinada a competições e a Inter para modelos de grande turismo.Por sua vez, do motor de Lampredi derivara o modelo Tipo 275 de sport e o 340 América, nome que indicava já claramente a ambição da jovem empresa pelo mercado dos Estados Unidos.

Previsto como modelo de grande turismo, os primeiros exemplares produzidos do 340 foram, no entanto, utilizados em competições e catalogados como sport/protótipos.As siglas dos novos modelos continuaram com o sistema original na qual o número indicava a cilindrada unitária, embora arredondado para mais fácil memorização.

Venderam-se 26 automóveis fornecidos, geralmente, apenas em chassis no qual o cliente mandava montar uma carroçaria a seu gosto.

A Ferrari passara a ser uma marca na moda que tentava os mais famosos estilistas de automóveis de Itália à Alemanha; de Fontana à Touring agli Stabilimenti Giovanni Farina; de Vignale a Campana.Outros se seguiram e de todos emergiu Battista Pininfarina destinado a ser, nos anos seguintes, o principal estilista da Casa de Maranello e a realizar automóveis dotados de grande encanto e beleza.

No anuário de 1950 que, contrariamente aos anteriores e seguintes, tinha apenas oito páginas, quatro das quais com ilustrações do interior da fábrica com as suas máquinas e instrumentos sendo as restantes com a actividade desportiva.

A Ferrari participou, directamente ou através dos seus clientes, em 74 competições. Venceu 46, com 33 segundos e 18 terceiros lugares, para as quais foram preparados 167 carros. Os cuidadosos contabilistas da empresa anotaram e registaram 107 650 quilómetros percorridos.

No seu prefácio, Enzo Ferrari refere-se ao "amigo Sommer" como um dos mais preciosos colaboradores e talentoso piloto que morreu aos 44 anos vítima de um acidente numa corrida em França.Agradecia igualmente a todos os amigos e colaboradores que contribuíram para transformar os seus carros num objecto de culto dos entusiastas do "Cavallino Rampante" em todo o mundo.

NOTA: Este "post" é um resumo livre e aumentado do capítulo respeitante ao ano de 1950 da obra "L'Opera i il sogno".

Contribuído por Armando de Lacerda , Terça, 2 de Dezembro de 2008 às 18:54

OS 1 000 QUILÓMETROS DO ALGARVE



O último fim-de-semana, apesar de um pouco cansativo para a minha já adiantada idade, foi pleno de satisfação porque tive o prazer de estar com alguns bons amigos e assistir a um lote de boas corridas das quais se destacam os 1 000 Quilómetros do Algarve.

Na sexta-feira, ainda cedo, marchei-me, com o meu filho Nuno, directo ao Autódromo Internacional do Algarve empreendimento que, através do que tinha lido e das fotografias que tivera oportunidade de ver, considerava uma obra importante.

Contudo, confesso que esta ultrapassou toda a minha expectativa pela sua grandiosidade e pelas instalações em si que possibilitam a realização de qualquer prova internacional, incluindo a Fórmula 1. Trata-se de um empreendimento que ombreia com o que de melhor e mais moderno se tem construído.

Como eu gostaria de ter visto aquele recinto com uma lotação para 85 000 lugares completamente cheio. Porém, apesar de um paddock pleno de animação e com muito público, as bancadas, apesar de terem sido vendidos 25 000 bilhetes, quase pareciam vazias.

O conjunto de máquinas e pilotos de alto gabarito mundial que se juntaram neste fim-de-semana no Autódromo do Algarve justificava bem a enchente por mim idealizada mas que, infelizmente, o culto pelo desporto automóvel no nosso país não é suficientemente grande para tornar isso possível.

Ficou-me o receio, que espero seja infundado, quanto à sua futura viabilidade económica devido à falta de público e à insuficiência de eventos que o tornem rentável.

Tenho esperança de estar a ver o problema com pessimismo e que a direcção do autódromo tenha uma dinâmica que possibilite um número cada vez maior de provas de forma a influenciar uma participação cada vez mais elevada do público.

Mas voltando à nossa digressão, depois de uma directa de Évora ao Autódromo, debaixo do permanente controlo de velocidade do meu filho, dirigimo-nos à bilheteira para levantar os acessos e como já se ouvia o roncar dos motores limitámo-nos a comer umas belíssimas sandes de lombo e precipitámo-nos para a bancada sequiosos de ver carros.

Depois de assistir a alguns dos treinos e de uma prolongada visita pelas instalações e pelo paddock, pelas 19.00 horas seguimos para Olhão onde o nosso amigo Caldeira nos havia preparado um jantar de peixe e nos prometia uma surpresa.

Na esplanada do seu café aguardei com grande curiosidade a surpresa que me estava reservada e a quem o Caldeira, sem revelar a identidade, telefonava, de vez em quando, a saber em que ponto se encontrava.

Quando chegou, tive a grande alegria de conhecer o Villickx de quem, através de vários comentários aos meus “posts” me tinha cumulado de elogios e consideração. Sem nos conhecermos pessoalmente já o considerava um amigo que muito admirava pelos seus oportunos comentários e excelentes trabalhos sobre Gilles Villeneuve, Jacky Ickx e Ayrton Senna.

António Posser de Andrade (Villickx) abraçou-me e com o seu cavalheirismo disse-me, sorrindo: “E eu que esperava vir encontrar um velhote”.

Sensibilizado por conhecer finalmente alguém que muito admirava e já considerava como amigo, ainda mais comovido fiquei quando o António me obsequiou oferecendo-me um valioso volume “Ferrari” de ReinerW. Schlegelmilch, Hartmut Lehbrink e Jochen von Osterroth, obra profusamente ilustrada e com detalhes de todos os modelos saídos de Maranello.

Obrigado, António! Não sei como poderei corresponder a tantas provas de consideração e amizade.

Dali seguimos para uma tasca na lota de Olhão onde foi servido um fresquíssimo e inesquecível peixe a um grupo composto pela família Caldeira, constituida pelo Alexandre, Esposa e seu filho Daniel, pelo Posser de Andrade, pelo Gerard Azevedo e por mim e meu filho. Juntar-se-iam ainda a nós, o Victor e o Hugo Ribeiro que chegaram mais tarde por terem estado ocupados nas boxes da Quifel ASM Team realizando uma excelente cobertura do evento para o seu esplêndido “site” Le Mans Portugal.



Que extraordinário convívio em que se falou de automóveis e pudemos estreitar ainda mais as amizades já existentes, encontro que se ficou a dever ao habitual dinamismo do Alexandre e que foi mais um feliz momento que perdurará nas minhas recordações.

Apesar de nos termos deitado tarde pois já passavam das duas, na manhã seguinte, às nove horas já estávamos de partida para Portimão, passando por Faro para darmos uma boleia ao João (Tuga F1) que se metera no comboio do Porto para Faro, sem boleia nem bilhete para o Autódromo e que se revelou um excelente companheiro resistindo a todos os ataques humorados de Alexandre.

Chegados ao Autódromo, onde o Pedro Branco distribuiu os bilhetes a quem ainda os não tinha, lá nos instalámos nas bancadas entremeando as corridas com deslocações ao paddock onde tivemos possibilidade de encontrar outros amigos como o Nuno Lorvão, o Caldeira, o Miguel Lacerda e onde, de novo, tive o prazer de estar, durante alguns momentos, com o Posser de Andrade.

Tive pena de não ter visto o meu amigo Raul Esperto com quem o Caldeira ainda esteve.

O Caldeira e o Moreno não se calavam com a felicidade que o indiscreto vento da serra algarvia lhes havia proporcionado com um espectáculo maravilhoso em que entrava uma morena com uma saia de balão.

Não sei o que viram mas que estavam delirantes … estavam!

Durante o dia, só fizemos uma interrupção para nos deslocarmos a Mexilhoeira Grande onde o Pedro Branco havia encomendado um almoço na Petisqueira “A Oficina” que nos proporcionou uma refeição recheada de óptimos petiscos.

Só foi pena que a “rigorosa” dieta do Moreno e a sua secura exigisse forte medicação de cerveja, tratamento de que estavam também necessitados o Nuno Lorvão e o Alexandre o que originou que víssemos apenas as três últimas voltas do “Classic Endurance Racing”, prova em que estava muito interessado e onde a dupla Fernando Espírito Santo/Ricardo Bravo, em BMW M1, ganhou a classe GT.

Compensei esta falta, com uma visita ao paddock onde tive o prazer de ver a belíssima colecção de protótipos e GTs das pistas de competição construídos entre 1966 e 1979. Que maravilhosos carros!

Durante o sábado e domingo tivemos a satisfação de ver que, entre tantos pilotos de elevado gabarito, os portugueses não saíram inferiorizados e subiram várias vezes ao pódio.

No troféu espanhol “Supercopa SEAT Leon”, prova com mais de 30 carros e que decorreu com muitas ultrapassagens, piões e toques, David Saraiva subiu ao pódio ao classificar-se em 2º. lugar.

No Campeonato Europeu de Superstars, Filipe Albuquerque, que nunca havia feito uma corrida de turismo conseguiu, num Audi RS4 a que faltava velocidade de ponta na recta, ser segundo nas duas corridas, chegando a passar pelo comando da prova, só não tendo possibilidade de acompanhar o ritmo de Morbideli.

Uma referência ainda para as corridas “Fórmula Renault 3.5”, “Radical European Masters” e “Fórmula Le Mans” onde Jérôme d’Ambrosio, piloto da DAMS na GP2, que aproveitara para vir conhecer o circuito onde terminará a temporada, ganhou a última corrida.

Deixámos para o fim a prova rainha deste evento: os 1000 Quilómetros de Algarve.

Tivemos oportunidade de assistir à primeira corrida nocturna da “Le Mans Series”, a uma das mais animadas corridas deste campeonato e a uma prova em que nem uma única vez vimos aparecer o “famigerado” safety car o que para mim foi motivo de grande satisfação.

Sou do tempo em que os acidentes na pista eram resolvidos apenas com o uso das bandeiras e talvez possa ser considerado antiquado mas a verdade é que abomino esta invenção importada dos Estados Unidos que só serve para juntar novamente todos os carros, desvirtuando, muitas vezes, o resultado da corrida. Infelizmente também caiu em moda na Europa e, por tudo e por nada, o vemos aparecer nas pistas.

O seu não aparecimento nos 1 000 quilómetros é para mim um dos sinais positivos desta prova que, pelo êxito que teve, penso jamais deixará o calendário de provas deste Autódromo.

A prova foi ganha pela dupla Jean-Christophe Boullion/Christophe Tinseau em Pescarolo 01-Judd da Pescarolo Sport que, com esta vitória, ultrapassaram a tripla Enge/Charouz/Mucke da Aston Martin no comando do campeonato, mostrando toda a eficácia de Pescarolo dada a sua grande experiência em corridas de resistência.

Dos portugueses há a destacar a vitória da dupla Miguel Pais do Amaral/Olivier Pla na classe “LM”P2 passando para o comando do campeonato. O Ginetta Zytec é, presentemente, o P2 mais rápido o que lhe permitiu comandar a classe desde o início da prova.

Na última volta, a quebra da suspensão lançou o pânico na equipa, mas o avanço de duas voltas que tinha na altura e a perícia de Olivier Pla permitiu cortar a meta vitoriosamente.

A dupla Tiago Monteiro/Bruno Senna foi ao pódio ao classificar-se em 3º. lugar, apesar das várias saídas de pista que teve ao longo da prova.

Miguel Ramos, com problemas de pneus na hora inicial, não conseguiu mais que um 5º. lugar e César Campaniço num Ferrari 430 GT2 obteve o 20º.

O outro português, Francisco Cruz Martins abandonou por ter falhado a travagem para a primeira curva o que o fez chocar com o Porsche do seu colega de equipa Richard Lietz.

No domingo, depois de assistirmos à última corrida da “Fórmula Le Mans”, dirigimo-nos ao café do Autódromo na esperança de comer uma apetitosa salada que havíamos visto quando ali havíamos bebida café de manhã. Mas, só já deparámos com os poucos restos existentes e tivemos que nos contentar com umas sandes de frango que até estavam muito boas.

Nos três dias que estivemos no Autódromo assistimos a toda uma organização, na nossa opinião, impecável e apenas discordámos de dois aspectos que queremos mencionar numa atitude que consideramos positiva.
A primeira, foi a publicidade feita para este evento sob o tema “as feras da noite estão à solta no Algarve” e que consideramos muito pouca atractiva. À laia de brincadeira sou levado a dizer que aquilo metia medo ao susto.

A outra, considero-a francamente infeliz e só posso pensar que se deveu ao entendimento de uma funcionária das relações públicas e não teve origem na direcção do Autódromo.

Do programa oficial fazia parte um “pit walk” entre as 17.45 e as 18.20 de sábado, mas fomos informados que o acesso ao paddock não dava direito ao mesmo o qual se destinava apenas a convidados, mas que poderíamos beneficiar desta regalia se pagássemos um extra de 45 euros. Apesar de argumentarmos que este extra não constava da tabela de preços, responderam-nos que era uma forma de limitar o acesso às boxes. Quase nos parecia “conversa de ciganos” nada adequada a um evento daqueles e ridículo pela verba insignificante que se obteria.

Assim termina esta nossa jornada por terras algarvias.

O resto não tem história. Foi o nosso regresso a casa com o meu filho ainda mais “chato” com as recomendações sobre condução e limite de velocidade que me chegou a enervar, de tal forma que tive de parar na primeira zona de serviço para dar três fumaças numa cigarrilha a fim de acalmar os nervos. Mas também sei que o Nuno só é assim, tornando-se até aborrecido, pelo que gosta de mim e pelos cuidados que eu lhe mereço.

Foram três dias em que tive o prazer de assistir a provas de um desporto que me apaixona e de privar com amigos que muito estimo.

Mas não posso deixar de constatar, com uma certa tristeza, que, talvez devido à minha idade, ou à falta da minha mulher que sinto cada vez mais, ou a ambas as coisas juntas, tudo é muito diferente do antigamente. Estou com os amigos e assisto às corridas com grande prazer, mas já não existe em mim aquele entusiasmo arrebatador com que via passar os carros e no convívio já não sou o conversador que fui noutros tempos limitando-me muito mais a ouvir do que a falar.

E tenho pena que seja assim!