segunda-feira, 6 de outubro de 2014

O AVÔ CÉSAR

Apesar de terem morrido muito antes de eu nascer, tenho pelos meus bisavós uma admiração e apreço muito grandes por tudo que fizeram pelo teatro. Quer da parte da minha Avó, quer do meu Avô, os seus Pais e meus Bisavós estiveram ligados ao teatro e penso, que é por isso, esta paixão tão grande que eu sinto pela Arte de Talma. Daí o desejo de deixar no meu blogue a história deles e, para isso, vou começar pelo Avô César. Augusto César de Lacerda nasceu em Lisboa a 6 de Dezembro de 1829. De família nobre era, por herança dos seus antepassados, moço fidalgo com exercício no paço. Assentou praça na Armada, como guarda-marinha, ali permanecendo algum tempo, tendo os seus mestres reconhecido nele grandes qualidades de trabalho. Em 1846, quando da Revolução da Maria da Fonte, meu bisavô apresentou-se ao serviço da Junta Revolucionária que se encontrava em Santarém. Terminada a revolução, volta à Escola Naval para continuar os estudos mas, devido a perseguições políticas de alguns professores, vê-se obrigado a abandonar aquele estabelecimento de ensino e assentar praça no 1º. Regimento de Artilharia Montada. Contra vontade, participa na revolução de 6 de Outubro combatendo, no Minho, os seus adeptos, pelo que resolve deixar o exército, sem recompensa alguma pelos serviços militares prestados e, como se nada herdasse de seu pai que tudo perdera nas lutas políticas, faz-se actor entrando para o Teatro D. Maria II, como discípulo do actor Epifânio, estreando-se a 29 de Abril de 1851 na peça “O Cavalheiro Duvernay”. Agradou bastante, mas eram tantos e de tanto mérito os actores que naquela altura faziam parte da companhia, tais como Epifânio, Rosa, Tasso, Teodorico e Sargedas, que dificilmente lhe dariam papeis. Tratou ele dos arranjar escrevendo as peças em que havia de sobressair: a primeira, a comédia em 2 actos “A Assinatura de El’Rei”, que obtém um grande êxito e depois a comédia em quatro actos “Duplice Existência”. No entanto, o reportório do D.Maria era quase exclusivamente composto de pesados dramas e meu bisavô sentia-se mais atraído para a evolução do moderno teatro francês o que o animou a aceitar contrato no Gymnasio onde teve a sua bela época de grande nomeada como actor e principalmente como autor. São dessa época as peças “Cinismo, Cepticismo e Crença” , “Dois Mundos “, “A Última Carta” e outras. Em 1856, constitui-se uma sociedade empresária para o teatro D. Fernando que lhe faz propostas muito vantajosas que meu bisavô aceita e para ali escreve o drama histórico “O Martir” e a ópera cómica “Palavra de Rei”, com música de Bramão e, ainda, a comédia “Cenas de Família”. No fim da temporada, resolve regressar ao Gymnasio onde continuam os seus triunfos com “A Probidade”, “Os Filhos dos Trabalhos”, “Mistérios Sociais”, “A Aristocracia e o Dinheiro”, “Defensor da Igreja” e “Trabalho e Honra”. Em 1861 é convidado a entrar para o Teatro D. Maria, então administrado pelo governo, que aceita pois não podia nem devia recusar a garantia do seu futuro através da assegurada reforma. Ali continua a sua feliz nomeada de actor correcto e autor laureado com as suas peças “As Joias da Família” e “Os Homens do Mar”. Em Junho de 1863 resolveu finalmente a partida, tantas vezes anunciada,para o Brasil onde é recebido entusiasticamente. Ali se uniu à actriz Carolina Falco com quem casou no Pará e de que tiveram dois filhos: meu Avô Carlos e meu tio-avô Augusto. No seu regresso a Lisboa, em 1869, é contratado juntamente com sua mulher, pela empresa Santos para o Teatro do Príncipe Real onde leva à cena mais dois originais seus: “O Monarca das Coxilhas” e “Harpa de Deus”. Terminado este contrato, em 1870, associa-se com Manuel Machado e com o Cruz do guarda-roupa par explorarem o Gymnásio onde leva à cena outra peça, “Os Homens que Riem”. Vai depois passar alguns meses ao Porto e regressa, de novo, para o Teatro D. Maria onde põe em palco as peças: “Os Viscondes de Algitão”, “Homens e Feras”, “O Botão de Âncora” e “Asmodeu”, peça que foi premiada. Algumas das muitas peças que escreveu foram publicadas em livro, das quais se destaca “A Grilheta Moral”, que ainda trabalhou mas que já não foi representada. Mais tarde, voltou ao Brasil onde esteve gravemente enfermo e de onde voltou impossibilitado de trabalhar. O Avô César foi um actor-autor que teve a sua época como poucos, conhecendo muito público e prestando serviços importantes ao teatro quer como escritor de todos os géneros desde o ligeiro, à comédia, ópera e drama, quer ainda como empresário e ensaiador. Representou em quase todos os teatros portugueses e fez várias “tournées” tanto no país como no estrangeiro. Entre outras, possuía as seguintes condecorações: Ordem de Cristo pelo seu mérito artístico e pelos actos de filantropia praticados em favor dos seus companheiros desvalidos; Ordem de Santiago pelo seu merecimento, manifestado na composição de muitas obras dramáticas; cavaleiro da Ordem de Isabel A Católica de Espanha, pelo êxito das suas peças que foram traduzidas e representadas em Madrid, como “A Probidade” com o título de “La Fragata Belona”, “Dois Mundos “ com a designação de “Los Peccados del Siglo XIX” e “Cinismo, Ceptismo e Crença” que foi representada em Cádis, com o mesmo nome. Foram-lhe conferidos ainda muitos diplomas de sociedade de beneficência e literárias do Brasil e de Portugal, dos hospitais portugueses e do Rio de Janeiro, Pernambuco, Baía, Porto Alegre e Pará, entre outros. Foi sócio benemérito de Filantropia da Associação Académica de Coimbra e membro do Grande Oriente Brasileiro, num grau elevado. Morreu a 1 de Janeiro de 1903, deixando o seu nome bem ligado à história do teatro, mostrando que valeu a pena quando optou por deixar uma carreira militar por outra muito mais válida: A VIDA ARTÍSTICA.

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